Blog do Doutor Fofinho

"Tudo começou há algum tempo atrás na Ilha do Sol..." Há muitos anos eu montei esse blog, dando o nome "Le Cul du Tabou", inspirado por uma amiga, para falar sobre o tabu das coisas. Ganhei muitos seguidores, mas desde 2018 não escrevi mais nele. Estou retomando, agora com novo nome, o "Blog do Doutor Fofinho", muito mais a minha cara, minha identidade. Sejam bem vindos.

Monday, December 18, 2006

POR QUE DIABOS O MUNDO É TÃO TRISTE?

Ando pela cidade e vejo muitas luzes coloridas, árvores enfeitadas, praças iluminadas. Está chegando o Natal e com ele... O que vem com ele mesmo? Acho que esquecemos. Não tenho muitas recordações boas do natal, mas guardo umas pequeninas, do quanto aquela fantasia toda era capaz de fazer reluzir meus olhos de criança. Lembro-me de um Natal que passei na casa de praia de meu avô. Eu e meus primos éramos obrigados a dormir para esperar o Papai Noel trazer os presentes pela chaminé da lareira. Ninguém dorme. Uma ansiedade, uma curiosidade e, de repente... Ops! Papai Noel passa correndo pelo quintal. Tomados pela fantasia, ninguém pensa na coisa ilógica daquele velhinho gordo descendo pela chaminé estreita. Ninguém pensa que o Papai Noel pode ser qualquer um dos tios chatos que estão passando o Natal com a gente. Até hoje vejo aquela chaminé na minha mente, com nossas meias penduradas.

E hoje vejo a uma semana do Natal, as pessoas lotando lojas, supermercados, shoppings, obrigadas a gastar dinheiro que não têm, obrigadas a comprar aquele presente para aquela tia chata porque senão “fica chato” não levar nada.

Até as revistas mudaram. Vi algumas reportagens sobre o Natal. Falavam sobre como não dar “gafes” na ceia e dos micos insustentáveis que as pessoas são obrigadas a pagar nessas reuniões familiares. Acho que há uma vantagem nisso, porque se pode falar abertamente do quanto uma noite de Natal pode ser desagradável. O véu de fantasia que encobria o Natal desabou. Acabou a fantasia. As pessoas sabem que são obrigadas e continuam se sentindo obrigadas, mas fingem menos. As crianças já sabem que o Papai Noel não existe, que são seus pais que compram os presentes e que o “tal” Menino Jesus é apenas um pretexto para ganha-los.

É então que me pergunto: mas se acabou a fantasia, porque as pessoas continuam armando o circo todo? Não acho que seja pelo espírito cristão ou respeito ao nascimento de Cristo. Acho que o ser humano é tão adestrado quanto os bois que são amarrados ao poste e, mesmo depois de soltos, mas com a corda no pescoço, ainda pensam que continuam amarrados e não vão embora.

E isso reforça a minha teoria de que as pessoas estão cada vez mais tristes, como o boi que suspira desconsolado com a corda em seu pescoço e ainda não conseguiu perceber que ele é livre.

Charles Chaplin, fala em “O último discurso”: “Soldados! Não vos entregueis a esses brutais... que vos desprezam... que vos escravizam... que arregimentam as vossas vidas... que ditam os vossos atos, as vossas idéias e os vossos sentimentos! Que vos fazem marchar no mesmo passo, que vos submetem a uma alimentação regrada, que vos tratam como gado humano e que vos utilizam como bucha de canhão! Não sois máquina! Homens é que sois! E com o amor da humanidade em vossas almas! Não odieis! Só odeiam os que não se fazem amar... os que não se fazem amar e os inumanos!”.

Acho que Chaplin, assim como Freud, era um visionário. E a maior qualidade de um visionário, na minha opinião é exatamente ter a capacidade de falar de algo que, mesmo dito décadas antes, continua atual, cabendo como uma luva, à compreensão do cotidiano. É claro que ele não falava do Natal, falava de uma outra guerra, mas tão adaptável à “Guerra do Natal”, com as pessoas se debatendo, se empurrando nas lojas, odiando tanto ter que gastar o dinheiro que não possuem para comprar esse ou aquele presente para a tia chata. Acho que Jesus, assim como os homens, está dormindo em sua manjedoura, para não ser obrigado a ver tantas calamidades.

E Paulo, o apóstolo, falando aos Coríntios, também se porta como visionário, falando, a meu ver, do quanto não conhecemos o amor:

“Ainda que eu falasse as línguas dos homens e dos anjos, e não tivesse amor, seria como o metal que soa ou como o sino que retine.
E ainda que tivesse o dom de profecia, e conhecesse todos os mistérios e toda a ciência, e ainda que tivesse toda a fé, de maneira tal que transportasse os montes, e não tivesse amor, nada seria.
E ainda que distribuísse toda a minha fortuna para sustento dos pobres, e ainda que entregasse o meu corpo para ser queimado, e não tivesse amor, nada disso me aproveitaria.
O amor é sofredor, é benigno; o amor não é invejoso; o amor não trata com leviandade, não se ensoberbece.
Não se porta com indecência, não busca os seus interesses, não se irrita, não suspeita mal;
Não folga com a injustiça, mas folga com a verdade;
Tudo sofre, tudo crê, tudo espera, tudo suporta.
O amor nunca falha; mas havendo profecias, serão aniquiladas; havendo línguas, cessarão; havendo ciência, desaparecerá;
Porque, em parte, conhecemos, e em parte profetizamos;
Mas, quando vier o que é perfeito, então o que o é em parte será aniquilado.
Quando eu era menino, falava como menino, sentia como menino, discorria como menino, mas, logo que cheguei a ser homem, acabei com as coisas de menino.
Porque agora vemos por espelho em enigma, mas então veremos face a face; agora conheço em parte, mas então conhecerei como também sou conhecido.
Agora, pois, permanecem a fé, a esperança e o amor, estes três, mas o maior destes é o amor.”

Eu gostaria que o mundo não fosse tão selvagem; que as pessoas fossem mais sinceras umas com as outras; que não houvesse trapaça, calúnia, difamações; que pudéssemos andar com os vidros abertos para respirar o frescor da manhã; que ao menos houvesse ar fresco para respirarmos.

Eu sonho com o dia em que não haverá tabu em dizer o que se sente, o que se pensa; um dia em que as pessoas se sintam suficientemente livres para se desobrigarem a comprar coisas que não querem comprar ou irem a lugares que não desejam. Acho que somente nesse dia poderemos realmente saber o que é amor; o que é amor ao próximo; o que é amar.

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