BURACOS....

Não vejo muita televisão. Sinto um desespero ao ver tantas desgraças, notícias ruins, falcatruas, vexames do nosso presidente. Esse isolamento televisivo (e também radiofônico) é uma forma de assegurar minha saúde mental. Fico sabendo das desgraças pelos outros, folheio a Veja rapidamente para me inteirar dos acontecimentos. Faz muito tempo que optei por essa forma de isolamento como uma técnica de manutenção do relaxamento.

Mas outro dia algo estranho ocorreu. Estava fazendo ginástica e, apesar de estar ouvindo música, havia uma TV pendurada na minha frente. Dela explodiam imagens dos acontecimentos da semana, que incluíam o buraco de Pinheiros, as chuvas, o trânsito e uma enorme cratera que se abriu no meio de uma cidade de interior do Estado e... Um buraco enorme no meio de uma estrada recém-construída... Parei para pensar: quantos buracos num só dia... Como está esburacado o mundo! Como está esburacada a vida!

E como minhoca pouca na cabeça é bobagem, desatei a pensar nos buracos da existência. Quantas devem ser as pessoas com enormes buracos nos estômagos, cheias de fome e vontades? Quantos buracos enfrentamos nas ruas, todos os dias, apesar do buraco que fica em nossos bolsos com tantos impostos? Qual o tamanho do buraco nos cofres públicos, causado por tantas falcatruas de governantes? Quantos “zilhões” de dentes esburacados devem existir só na cidade de São Paulo? Quantas pessoas se sentem vazias, como o peito esburacado por amores não-correspondidos? Enfim, se somarmos todos os buracos de todas as coisas, concretos ou simbólicos, com certeza teremos mais buracos do que gente pra cair neles. Um único ser humano tem em seu “domínio” mais buracos do que ratos ou baratas por cidadão... Fiquei pensando também nos buracos que temos que tapar, para encobrir falhas dos outros...

“Obreiro de Deus que tapai os buracos do mundo, tende piedade de nós!”

Muitos cientistas, filósofos e psicanalistas falam da crise do mundo contemporâneo, da questão do exacerbado consumo e dos medicamentos como paliativos para o vazio da existência. Acho que eles devem ter razão. E me dei conta disso quando pensei nesses buracos todos: a alma, o espírito, as ruas, os bolsos, os corações, as mentes... Tudo tão esburacado, tão vazio que dá até medo... Será que um dia isso será diferente?