A CÓPULA DAS MINHOCAS

“I'm a Barbie girl, in a Barbie world
Life in plastic, it's fantastic!
You can brush my hair, undress me everywhere
Imagination, life is your creation”
(Barbie Girl, performed by Aqua)
Sábado, vinte de dezembro de 2008. Show da Madonna em São Paulo. Eu e alguns amigos estivemos lá, como milhares de pessoas de todo o Brasil. O Show foi fantástico e, além de tudo, tranquilo, sem grandes aglomerações. Saímos do estádio “eletrificados”, cheios de vontade de continuar a balada. Coringa na manga da camisa: um dos amigos tinha VIPs para uma balada.
Balada essa que, de antemão, sabia não ser das minhas prediletas. Música eletrônica desconfortavelmente pesada, aglomeração e gente fora da órbita: um dos “points” dos Ecstasys, dos GHBs e todo os outros tipos de enlouquecedores conhecidos. Ao chegarmos, a coisa não estava tão desesperadora. O desespero foi chegando aos poucos, com gente, gente e mais gente entrando, o calor aumentando, o barulho ensurdecendo e as mega-luzes irritando meu astigmatismo. Sorte estarmos na ala VIP,dançando num camarote vazio, longe do calor e da muvuca.
Enquanto dançava, viajava. É engraçado estar sóbrio no meio de gente maluca. Observava todo o salão, o comportamento das pessoas, uns dançando nos “palquinhos”, os go-go boys e girls esbanjando egocentrismo. Foi então que passei a observar um grupo específico: as barbies (tenho um amigo que as chama de “musculokas”). Bem na primeira parte do salão, grudadas na mesa do DJ, elas vão se aglomerando. Não, não são apenas musculosas sem camisa. Elas representam um movimento cultural e social organizado.Elas têm um Dress Code: músculos, correntes, tattoos, corpo liso, cabeças raspadas, jeans, óculos escuros, garrafinhas d’água no bolso e, é lógico, muito “E”…..
Embora em lugar público, só entra no “bololô” das barbies quem é convidada… o preço é ter peito estufado, bíceps avantajado e tirar a camisa. À medida que elas vão se amontoando e o Ecstasy vai “batendo”, todas vão tirando suas camisas e se tornam mais e mais “afetuosas”… Todas se beijam, se abraçam, se alisam… E a imagem-mosaico de quem está vendo de cima, como eu, do alto do meu camarote, é de gomos brancos se entrelaçando até um ponto em que não há rostos, não há formas humanas… Pensei em várias coisas que comporiam esse mosaico: bolinhas de nhoque, nuvens brancas no céu…não, não e não! A figura mais representativa desse fenômeno em minha mente foram… minhocas!
Sim, minhocas! Branquelas, lisinhas (ainda que depiladas), compostas de gomos e entrelaçando-se como ficam os bichinhos nos buracos da terra… Apertando-se, esfregando-se, amontoando-se para caber mais e mais… Um grande copula de minhocas, embora uma copula estéril, graças ao EEEEEEEEEEEEE! É lógico que pode não ser tão estéril, desde que os laboratórios farmacêuticos inventaram o Viagra® para quem prefere a “atividade” e, para as restantes, sobra o que as minhocas fazem de melhor: a “passividade” dos seus buracos! Ou, como diz o ditado “Quem tem boca vai à rola!”. É claro que é preciso ter espelhos por perto, já que não importa tanto o prazer, mas a performance muscular!
Se Narciso está vivo em algum lugar, ele está se roendo de inveja! Se a mitologia não tivesse falado dele, algum psicanalista contemporâneo ficaria rico cunhando o termo “barbiesismo” e Narciso seria nada perto do império das barbies...
Como gordinho e peludo que sou, posso ouvir dizerem que estou com inveja, porque não fiz parte do “club”. Sim, digam isso,digam. E eu responderei: é lógico que gostaria de uns quilinhos a menos, que algumas roupas servissem com mais facilidade. Mas não quero trocar o meu “recheio” por aparências sem conteúdo. Quero minha mente livre, quero poder comer chocolate, sorvete, macarrão e risoto e quero meu fígado livre da cirrose e do câncer causados pelos anabolizantes...
E me pergunto? Elas são felizes? Será que esse mundo vazio, oco, embasado na aparência leva a algum lugar alem das pistas de dança, das “passarelas” das praias em seus “points”? Não sei responder... Uma das minhocas que estava no “bololô” devia ter uns 60 anos... estava lá,meio musculosa, meio flácida, tatuada, com a camiseta pendurada na calça... a diferença é que ela não era alisada por ninguém... mas sorria, alisando a si mesma.... Deve ser a felicidade possível...
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