Blog do Doutor Fofinho

"Tudo começou há algum tempo atrás na Ilha do Sol..." Há muitos anos eu montei esse blog, dando o nome "Le Cul du Tabou", inspirado por uma amiga, para falar sobre o tabu das coisas. Ganhei muitos seguidores, mas desde 2018 não escrevi mais nele. Estou retomando, agora com novo nome, o "Blog do Doutor Fofinho", muito mais a minha cara, minha identidade. Sejam bem vindos.

Sunday, January 25, 2009

A CUCA QUE HÁ EM NÓS


Todos nós temos um Cuca interna. É diferente daquelas pessoas que são Cucas fulltime.Estou falando desses momentos em que a Cuca, aquela bruxa-crocodila que vive no meio da selva da nossa mente, resolve passear pela nossa consciência, invade nossa razão e enche de sangue nossos olhos. E quando ela sai, f * tudo.... Fala verdades, inverdades, grita, berra, xinga, esbraveja...

Outro dia contei a vocês uma história da Narizinho que vira Cuca. E desde então a Cuca tem rodado meu pensamento. Não, não estou nessa “fase-cuca”... Estou apenas querendo refletir sobre a importância de deixa-la sair vez ou outra.

Guardamos a Cuca na jaula a maior parte do tempo porque temos medo do estrago que ela faz quando está à solta.. Até no Sitio do Pica-pau Amarelo era assim.. Ela ficava quase todo o tempo na floresta e aparecia algumas vezes com alguma maldade, mas muitas vezes suas maldições e maledicências apareciam quando seu espaço era invadido ou quando alguém a procurava para fazer pactos ou tramóias.

Fiquei pensando se essa não era uma forma do brilhante Monteiro Lobato representar a maldade que existe no mundo, em nós mesmos e, mais profundamente, o lado obscuro das coisas da vida.

Diversos contos infantis e até revistas em quadrinhos falam sobre isso. Talvez seja uma tentativa de mostrar aos pequenos que a Cuca existe e até pode sair de vez em quando. Infelizmente, como vivemos numa sociedade hipócrita, onde o que deve prevalecer é submissão e auto-controle, onde nossos espelhos morais são o sorriso do Padre Marcelo, do Papa Bento sei-lá-o-que e do Dalai Lama, somos treinados a sufocar a Cuca, prende-la a vácuo no fundo da nossa alma e, de preferência, esquecer que ela existe.


A Cuca não morre jamais. Mas é fato que muitas vezes nos esquecemos dela. E é por isso que nos assustamos quando ela aparece. Achamos feia, gosmenta, asquerosa. Esquecemos que ela é um pedaço de nós que vem à tona pra trazer a verdade e a libertação.

Outro dia, uma Cuca dessas falou uma porção de verdades para um monte de pessoas reunidas. Depois perguntou pra mim se eu achava isso bonito. Disse a ela que sim. E ela disse que eu estava errado, que isso era muito feio. Acho que tivemos um “misunderstanding” (A gente se orgulha de muitas palavras na nossa língua, mas podemos encontrar pérolas em todas as outras... Essa palavra é uma delas... Gosto de
overreacting também...). Digo isso porque é possível que ela estivesse falando da feiúra das atitudes que ela denunciava, mas eu digo que achei bonito porque era um momento “Cuca”, onde a verdade vinha à tona e, como tal, tem uma beleza particular. A violência, a crueldade ou a dor guardam em si aspectos terríveis e repulsivos, mas quantas pessoas se comovem com a beleza fotográfica de uma morte violenta num filme?

Acho que devemos tentar reverter o processo e amar as Cucas que existem em nós. É possível que, amando-as, deixem de ser Cucas, temidas, execradas, escondidas. Simplesmente porque não existirá nada mais a esconder.

Friday, January 23, 2009

O DESPERTAR DAS HISTÉRICAS E A REVELAÇÃO DOS HISTÉRICOS

“Mandacaru quando fulorá na seca
É um sinal que a chuva chega no sertão
Toda menina que enjôa da boneca
É sinal de que o amor já chegou no coração.
Meia comprida
Não quer mais sapato baixo
Vestido bem cintado
Não quer mais vestir gibão
Ela só quer
Só pensa em namorar
Ela só quer
Só pensa em namorar”
(Xote das Meninas, de Luiz Gonzaga)

Sim, terapia funciona. E às vezes funciona quando menos esperamos e com quem menos poderíamos acreditar. A menina que veste gibão, de repente, se transforma no diabo que veste Prada. E explode uma coisa louca, um furor de útero que jorra desejo, respingando luxúria pra todos os lados.

E isso é um trabalho de bons terapeutas. Tranformar um poço seco numa fonte se dissociações e seduções muito à mostra, é obra-prima de “psis” empenhados em dar vida ou corda aos seres do pântano.

Mas a histérica que sai do armário, sai como a Emília do Sítio do Pica-pau Amarelo: sai torta, desengonçada, com trejeitos exagerados, cheiro de naftalina e achando que está abafando. Sente-se mulher, dona de si, mas não sabe que, no fundo, é feita de pano e palha de milho. Na premente ardência do seu fogo, entra em combustão espontânea, queima-se e queima tudo o que está por perto.

Infelizmente retirei a história que contei por questões éticas...
Fica pra próxima....

Monday, January 19, 2009

PAI, PAI, POR QUE ME ABANDONASTE?


Cristo fez um montão de coisas: fez a luz, curou leprosos, deu de beber aos bêbados, transformando água em vinho. E tudo o que ele fazia, louvava e atribuía ao seu-nosso Pai, o bofão, todo-poderoso, Deus. Levou chicotadas, foi sarreado pelos romanos e sabe-se lá o que mais que a borracha dos homens ousou apagar...

Mas no auge do seu sofrimento, pregado na cruz, coroa de espinhos, flecha no peito, ele ousou cometer aquele que foi considerado o seu único pecado (assim disse a freira na minha aula de religião na quarta-série): “Pai, Pai, por que me abandonaste”.

Dizem que depois eles acertaram as contas no céu. Que o todo-poderoso explicou a Jesus que ele sabia desde o princípio, e que o princípio era o verbo e blá,blá, blá.... E Cristo perdoou mais uma vez, como quando somos obrigados a engolir as asneiras de um chefe.

Mas o “mote” do nosso papo é esse abandono. Por que é que os pais (e digo os fathers, não os parents...) abandonam seus filhos? E não bastasse o abandono, por que a violência, o desprezo, o castigo, a dor?

Quis escrever sobre isso porque assisti um filme chamado “Um segredo entre nós” (Fireflies in the garden), inspirado na biografia do escritor Robert Lee Frost, onde um pai violento, cruel, “danificador”, ferra com a vida da mulher e filhos, mata a mulher num acidente de carro e “tudo termina bem no final”... Como pode terminar bem no final? Como é possível perdoar alguém que destruiu sua vida, sua mente, sua esperança?

Vasculhando os porões da sabedoria cibernética (aka Google), descobri essa frase de um jurista brasileiro, Luiz Eduardo Fachin: “A paternidade não é apenas um dado; a paternidade se faz”. E comecei a raciocinar sobre ela. E concordo com ela. Ontem assisti um outro filme, chamado “The Groomsmen”( com o título idiota em português “Noivo em fuga”) e o irmão do noivo revela, no meio da confusão dos preparativos para o casamento, que é estéril. Seu irmão, o noivo, diz a ele que “fazer um filho é fácil, difícil é ser um bom pai”. E percebo que há uma ligação entre a frase do filme e a do jurista. De fato, paternidade, num sentido mais amplo, não é apenas dar o seu espermatozóide a um óvulo, não é apenas produzir seres em série com a sua cara, não é dar um nome, um sobrenome. Tudo isso, embora tenha uma certa importância, é o começo de tudo. A coisa mais importante é o que se constrói a partir daí. Um mar de possibilidades.

E considerando que seja essa a verdadeira paternidade, esse prisma, esse espectro, nada tenho a fazer senão lamentar a orfandade dos filhos do mundo. Existem mais órfãos do que de fatos vemos, pensamos, cremos. Mas deixemos confortáveis os órfãos que não se vêem como tal. Deixemos crer que são filhos, que têm pais, que são paternizados. Contemos mentiras a eles em prol de um mundo mais mentiroso.