DIA DE XANGÔ-AIRÁ (29 DE JUNHO)

“Quem é o Rei de Aruanda, quem é que vence demanda, quem é o dono da pedra é Xangô”
“Xangô yara oro... Ogum te coroou...Filho de pemba na Umbanda chora... É meu Pai Xangô que chegou agora”
Faz quase dois meses que escrevi esse texto. Fiquei tímido de blogá-lo. Mas tenho pensado que somos mais felizes quando somos inteiros e verdadeiros e, sendo meu blog uma forma de expressar e comportilhar minhas idéias, experiências e crenças, nada mais justo que falar também da minha fé. É como disse Fernando Pessoa (na pessoa de Ricardo Reis): "Para ser grande, sê inteiro: nada teu exagera ou exclui. Sê todo em cada coisa"...
Hoje é um dia especial. Tinha me falhado a memória, quase passou batido, mas Xangô-Airá veio em minha mente avisar, pra que eu não esquecesse desse dia. Eu que sempre me achei órfão, eu que sempre me vi sem um pai de verdade, porque passei vinte e tantos anos da minha vida sendo rejeitado por um pai biológico, perdi tempo e energia querendo, ora ser amado e reconhecido por esse pai, ora odiando e maldizendo essas origens, querendo matar o que existia dele em mim.
Sim, perdi tempo. Olhando para esse pai terreno, imperfeito e cruel, olhei menos, acreditei menos, amei menos esse Pai, esse verdadeiro Pai que sempre trouxe vida, luz, verdade, ensinamento por toda a minha existência. Sim, deixei até por vezes de crer em sua existência, mas como se diz em um de seus pontos “Se um dia eu perder, a fé nesse Senhor, que role essa pedreira sobre mim”. E a pedreira rolou sobre mim. Desabou, fez barulho, cataclisma,explodiu.
Mas hoje, “nessa noite tão fria de junho, Xangô”, nesse 29 de junho tão frio e tão quente ao mesmo tempo, eu dobro meus joelhos perante sua presença. Não tenho espaço nem oportunidade pra acender velas ou fazer rituais de fogo, nem pude fazer seu amalá. Mas dentro do coração desse filho orgulhoso e amoroso, estão as velas, o alimento, o fogo, a vida pulsando, pedindo que eu possa ir até seus pés, porque o senhor sempre veio até mim.
Mãe Jamile, uma “grande e verdadeira amiga que escolhi no espaço”, como dizia um de seus mentores, foi a pessoa que me apresentou ao meu Pai. Foi num jogo de búzios, em sua casa. Ela disse, de uma forma bonita, inflamada, que eu era filho de Xangô e que esse era o melhor Pai que alguém poderia ter. Ela disse: “Dizem que Xangô não gosta da morte e que abandona seus filhos quando eles estão no fim da vida; mas eu não acredito. Xangô jamais abandona seus filhos”. E eu também acredito que Xangô nunca me abandonou. Fui eu quem fugi dele algumas vezes. E mesmo que ele me abandone quando estiver chegando minha morte, confiando meus últimos dias a um outro pai ou mãe, mesmo assim estarei orgulhoso de ter sido guiado por ele até ali. Morrerei orgulhoso e amoroso filho dele.
E assim tem sido minha história com esses pais, mães e mentores. Nunca ninguém me abandonou. Eles sempre estiveram por perto. Faltou de minha parte percebê-los e, em muitas vezes, aceitar sua presença. Hoje não preciso mais de provas ou sinais. Creio, venero, amo, adoro, confio, sinto, completo-me, não apenas como um ser vivo, mas como um ser espiritual, tentando melhorar dia após dia.
Te amo, Pai Xangô.