Blog do Doutor Fofinho

"Tudo começou há algum tempo atrás na Ilha do Sol..." Há muitos anos eu montei esse blog, dando o nome "Le Cul du Tabou", inspirado por uma amiga, para falar sobre o tabu das coisas. Ganhei muitos seguidores, mas desde 2018 não escrevi mais nele. Estou retomando, agora com novo nome, o "Blog do Doutor Fofinho", muito mais a minha cara, minha identidade. Sejam bem vindos.

Saturday, June 26, 2010

SÍNDROME DE ODETE ROITMAN



“Brasil!
 Mostra tua cara / 
Quero ver quem paga / 
Pra gente ficar assim / 
Brasil! 
Qual é o teu negócio?
 O nome do teu sócio?
Confia em mim...” (Cazuza)

“Ai que horror! Olha o que esse pobres comem!” (Uma amiga da faculdade, ao ver um outdoor do Caviar com rapadura)

Se gostasse de futebol, estaria de luto pela derrota de minha pátria “anímica”. Francesíssimo no último, não sou de ficar simplesmente enaltecendo coisas internacionais e desvalorizando as brasileiras, mas tem vezes (várias) que me dá muita raiva de ser brasileiro ou, simplesmente, de morar no Brasil.

Hoje tive altos e baixos. O ponto “alto” foi ter ido ao restaurante Obá pra comer pratos de um festival de comidas da Amazônia. Comi pato no tucupi. Estava tão maravilhoso (e tão pequeno) que me vi obrigado a comer duas vezes. Realmente nossa cozinha regional é fantástica. Mas logo o espírito de Odete toma conta de meus chakras e viro bicho. Lembro de todo o resto de coisas que comemos mal, bebemos mal e ainda pagamos caro por isso. Recém chegado de Paris, lamento pagar dez vezes o preço de uma garrafa de bom vinho em Paris pela garrafa de um mediano em São Paulo. PQP... mas Odete não fala palavrão...

Mas o que mais me emputece e me entristece é falta de qualidade dos serviços ao consumidor e a impunidade dos que nos oferecem. Somos maltratados, roubados, passados para trás e não podemos fazer quase nada a respeito.

Essa semana aconteceu um negócio estranhíssimo comigo. Claro que foge um pouco dos exemplos mais gerais, dada a bizarrice da coisa, mas ainda cabe no “kit completo de enganações e desrespeitos ao consumidor brasileiro”. Já faz uns cinco anos, recebo ligações regulares de uma moça vendendo clubes de descontos e time-share. Não é que eu recebo ligações e não; é ela que, ano após ano, liga vendendo um novo e fantástico clube de benefícios. Hilton Club, Gourmet&Travel, Pestana Club e, mais recentemente, Advantage Club. Todos oferecem diversas vantagens mas, com elas, geralmente uma série de problemas, como problemas na hora de reservar serviços disponíveis ou, o mais terível deles, uma enorme perda de tempo e maus tratos na hora de pagar a conta dos restaurantes, ou porque o cara do caixa nunca ouviu falar naquilo, ou porque eles desejam dar um desconto menor que o prometido. Já cheguei a ameaçar de chamar a polícia para poder fazer valer meu desconto: um excelente modo de fechar um jantar, não é mesmo?

Mas voltando à mocinha. Há coisa de um mês uma amiga me advertiu que a tal havia ligado pra ela, oferecendo o tal serviço, coisa que não o fiz e informando à minha amiga meu itinerário de viagem. Pra onde ia, com quem ia, quanto ia pagar... Fiquei puto com a falta de privacidade. Enviei um email à empresa e não obtive resposta. Reenviei o email e nada. Essa semana, entre trocas de emails para efetuar uma reserva, solicitei uma posição sobre minha reclamação.

Eis que me liga a mocinha. Sem quase me deixar falar, explicou que aquilo (leia-se: a falta de ética e de sigilo) era procedimento da equipe, que eram treinados para isso (leia-se: expor a privacidade dos clientes). Eu disse que não concordava nem com a abordagem e nem com o fato de meu cadastro, que deveria ser sigiloso, circulasse pelas empresas pelas quais ela passava. Nisso a mocinha virou dragão. Começou a cuspir fogo e gritar ao telefone, como uma cliente insatisfeita. Tentei explicar a ela que aquilo era uma inversão de papéis, porque eu era o cliente. Acabou que desliguei na cara dela. Quinze minutos depois ela me liga, respira fundo e diz: “Ok, Marcelo, vamos conversar”. Eu disse: “Está certo. Mas em primeiro lugar eu peço que você nunca mais repita essa atitude...” E não consegui falar mais. O dragão berrava na minha orelha, que não admitia ser injustiçada, que eu não tinha nada a ver com a sua vida e por aí afora. Desliguei o celular. A coisa terminou que até o diretor da empresa ligou se desculpando. Decidi não cancelar o plano, porque é muito vantajoso. Mas já aviso: se alguém dessa empresa ligar falando em meu nome, chuta que é macumba!

Outra manchete da semana. A Porto Seguro e a Associação Parada Vital oferecem um serviço aparentemente legal: bicicletas e bicicletários grátis na cidade. Na sexta-feira, dia de jogo do Brasil, resolvi fazer minha primeira jornada. Peguei uma bike no Conjunto Nacional, na Avenida Paulista e fui pedalando até a Rua Sena Madureira, na Vila Mariana. Pedalei sete quilômetros, cheguei quase morto lá e, ao chegar no ponto de devolução, na garagem do Novotel, não havia ninguém. Liguei para a tal Associação. A moça foi muito gentil, mas enquanto deixava a linha aberta, pude ouvir a brilhante idéia, bem brasileiras, do seu supervisor: levar a bicicleta para outro ponto, por exemplo. Meia hora depois, exatamente o tempo que levei pedalando, recebi a informação de que poderia deixar a bicicleta com o pessoal do hotel. Pelo menos deu pra esfriar o corpo... Um empreendimento muito moderno, mas nada seguro...

Não, a semana ainda não acabou! Odete Roitman é atacada mais uma vez. Há mais de um mês o meu iPhone está com problemas. Quando estava em New York, levei-o à Apple Store para ver ser era possível reparar o problema. Rapidamente atendido, o funcionário tentou reparar o defeito e, como não foi possível, ele iria dar um aparelho novo, só não o fez porque, vindo do Brasil, teria problemas com o funcionamento da linha (RRRRRRRRRRRRRRRRRRRRRRRRRRR!!!)

Liguei para a assistência técnica da Apple no Brasil e eles me informaram que eu deveria ligar para um número específico da Vivo (minha querida operadora) que atendia os portadores de iPhones. Após uma hora de espera e várias ligações derrubadas, fui atendido e me informaram que eu deveria me dirigir à loja da Vivo para trocar o aparelho, com todos seus apetrechos.

Cheguei à loja no Shopping Iguatemi assim que abriu, para evitar as intermináveis filas das operadoras. Para meu espanto, fui rapidamente atendido e em quinze minutos estava com meu iPhone novinho! Quase chorei de emoção. A atendente pediu que eu esperasse para pegar a nota fiscal. Perguntei a ela: “E a caixa, os fios?”. Ela respondeu: “Ah, não. A caixa e os fios fica com a gente. A gente só troca o que o cliente traz.” Como tinha levado os fios, ela trocou pra mim. Favorzão. O que eles fazem com a caixa. Nunca vi trocar as partes de artigos com defeito. Imagina eu ser chamado para um recall de um carro, trocá-lo, mas sair com as rodas velhas.

Mas a saga da Vivo não acabou. Já que estava na loja, resolvi perguntar porque eu não estava recebendo mensagens de SMS (aka torpedos) há dois dias. O atendente fez um teste e a mensagem chegou. Ele disse: “A pessoa que mandou deve estar digitando algo errado”. Daí eu fervi e disse: “Meu amigo, você não está falando com retardados (nem quis dizer que era exatamente a situação inversa...). Estou dizendo que há dois dias NINGUÉM consegue me enviar mensagens. Será possível que todos os meus amigos, parentes e pacientes estão digitando errado?”. Retardado que se preza, grita pra outro quando não sabe o que dizer. E foi o que ele fez. A outra (retardada) berrou do outro lado da loja: “A pessoa que mandou deve estar digitando algo errado”. Repeti, aos berros a mesma coisa que havia dito ao primeiro. Não adiantou. Ela respondeu: “A pessoa tem que vir aqui para a gente estar verificando se ela está digitando algo errado.”

Então eu desisti. Resolvi convocar todos que eu conheço para me prestigiarem na loja da Vivo. Pelo menos é no Iguatemi. Publiquei no Facebook: “A Operadora Vivo (aka Morta) solicita que todos os meus amigos e pacientes que não estejam conseguindo me enviar SMS compareçam à loja do Iguatemi para verificarem se não estão digitando alguma tecla errada! Pra compensar o trabalho, estarei na porta, vestido de coelhinha da playboy, distribuindo champagne, pistache e nariz de palhaço gratuitamente!”

O melhor de tudo é que não fiquei exatamente nervoso. Minha pressão não subiu, minhas mãos não tremeram, não falei palavrões, nem sozinho no carro. Apesar da semana conturbada, permaneci sereno, tranquilo, feliz. Acho que é porque estou tão feliz essa semana que nem essas coisas foram capazes de me tirar do sério. Mas o espírito de Odete Roitman não se aquietou. Porém, como já se passaram vinte e um anos de seu assassinato, é bem possível que seu espírito tenha evoluído; foi assim que, ao invés de falar mal dos tupiniquins, ela resolveu me inspirar nessa blogagem.

Obrigado, Odete Roitman.

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