PREÇO TABELADO: O COMBINADO NÃO SAI (TÃO) CARO

Não sei se são as veias ancestrais ocultas, coisas cármicas ou sei lá o que mais, o fato é que sempre tive afinidade com a cultura judaica. Mesmo antes de conhecer mais de perto, sempre me interessei, li a respeito, sentia vontade de conhecer o universo, a cultura desse povo.
À medida que fui conhecendo, me apaixonei mais e mais pela comida. Ouvi dizer que não existe uma comida judaica típica, que ela se compõe de uma mistura de influências (ou “copiâncias”) das comidas de vários países por onde os judeus se espalharam, e que não são poucos.
De todas as coisas, tem umas que eu gosto muito mais: bagels, pastrami e gefilte fish.
O Bagel é um pãozinho fofo, com um buraco no meio, que pode vir coberto com gergelim, alho, cebola ou ser feito com coisas doces ou frutas. Adoro comer bagel com cream cheese e Lox (um tipo de salmão seco) com mostarda e dill (umas ervinhas aromáticas parentes da erva-doce, aqui chamada de fucho). Houve uma época em que trazia vários pacotes de bagels dos Estados Unidos para congelar. Desisti de fazer isso não foi porque eu enjoei deles. É porque a conta calórica dessa remessa diária de carbos não estava dando muito certo...
O pastrami é um tipo de carne seca desidratada. Gostei de todos os que já comi, mas os melhores estão realmente em Manhattan, principalmente no Katz Delicatessen. Lá você come um sanduíche de pastrami por uns dez dólares, mas que valem pela refeição de um dia inteiro. Até porque, além do sanduíche enorme, esses restaurantes colocam uma bacia de pepinos em conserva e uma tigela de Cole Slaw (uma salada de repolho adocicada maravilhosa), o que já dá uma certa sustância. Diversas vezes cheguei a jogar o pão fora pra comer só a carne ou levar metade do sanduíche para casa.
No meu desespero pela busca de um bom pastrami, já percorri várias padarias, empórios judaicos, delicatessens e importadoras chiques. Até então nunca havia achado nenhum que chegasse aos pés dos de NY. Já tentei até fazer em casa e não deu certo. A carne, depois de seca, assada, temperada e todo um processo que durou mais de uma semana, resultou num pedaço de carvão com cheiro de fumaça. Domingo retrasado, na minha greve de jogo do Brasil, decidi ir ao AK Delicatessen para comer. Já havia estado lá outras vezes e não tinha gostado muito do pastrami. Ia sentar lá pra almoçar, mas como faltava menos de uma hora para o maldito jogo, fiquei com medo do pessoal da cozinha cuspir na minha comida ou colocar caquinha de nariz no sanduíche. Pedi para levar um sanduíche de pastrami e um cheesecake. Mas dessa vez, algo mágico ocorreu. Mudaram a receita e foi o melhor pastrami que comi aqui no Brasil, quase igual aos de NYC.
Last but not least, a terceira coisa judaica que mais amo é o Gefilte fish. Esse é um bolinho de peixe com farinha de matzá que é fantástico. Só tem duas coisas que não gosto nele: a primeira é o acompanhamento. Raiz forte. Todas as mães judias do universo falam que “não existe gefilte fish sem raiz forte”. Uma vez comprei uns dez deles para levar pra casa e a Jewish Mame trouxe toda orgulhosa os potinhos de raiz forte. Educadamente agradeci. Ela repetiu a frase secular. Face à insistência, aceitei por educação e a filha dela, intragável, desgraçou a gentileza, dizendo: “De graça aceita qualquer coisa, não é mesmo? “ . Não a destratei por educação, mas juro que guardei o pote por uma semana para devolver a ela, pra que ela visse que estava intocável. Mas passada a raiva e aumentado o terrível cheiro pela casa, resolvi jogar fora. Até porque ela não compreenderia a essência da minha atitude.
A segunda coisa que não gosto nele é o preço. Porque diabos um simples bolinho de peixe amassado com farinha custa, em média, dez a quinze reais. São Paulo, New York, Paris, Praga, México, Belo Horizonte. Por onde passei e comi, paguei o mesmo preço. Especulei mentalmente: as Jewish Mames tabelam os gefiltes. Acho que o gefilte é um alimento especial, tipo um “Mc Lanche Feliz” judaico que reverte em um fundo para a comunidade judaica mundial. Na verdade, nada que eles fazem é barato. Tudo bem que eles gostam de coisas chiques, saborosas, de qualidade, mas que é caro, é caro.
Enfim, ser feliz custa caro. Em dinheiro, em empenho, em intenção. E acho que vale o preço. E como diz o ditado: “o combinado não sai caro”, mesmo que seja caro, você sabia que ia ser....
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