Blog do Doutor Fofinho

"Tudo começou há algum tempo atrás na Ilha do Sol..." Há muitos anos eu montei esse blog, dando o nome "Le Cul du Tabou", inspirado por uma amiga, para falar sobre o tabu das coisas. Ganhei muitos seguidores, mas desde 2018 não escrevi mais nele. Estou retomando, agora com novo nome, o "Blog do Doutor Fofinho", muito mais a minha cara, minha identidade. Sejam bem vindos.

Sunday, February 20, 2011

COLINHO DE “VÓ”


Sou um invejoso confesso. Sinto falta de uma coisa que tive pouco: colo de “vó”. Não conheci minha avó paterna; só sabia por fotos que ela era uma mulher bonita, com traços fortes indígenas e que parecia ter sido uma pessoa boa. Conheci minha avó materna, a Izolina, filha de Gersomina e Caetano, italianos chegados ao Brasil de navio na adolescência. Também curti pouco esta; cuidou muito de mim nos meus primeiros anos de vida e foi também embora logo nesses primeiros anos. Lindas feições italianas, cabelos negros, cara pálida. Vi uma vez uma foto de quando era jovem e entendi porque meu avô fugia do plantão do quartel para ir namorá-la. Parece que se amaram muito. Contam que ela dizia escrever o nome dele até na água. O câncer a levou de mim quando eu tinha apenas três anos. Eu me tenho lampejos de alguns momentos ao lado dela, mas a cena que mais ficou gravada na minha mente é eu segurando o lóbulo de sua orelha com minha mão direita, em pé, ao seu lado e de meu avô, enquanto viajávamos para Peruíbe.

Nunca mais a vi. Lembro-me ter sonhado, uma vez com ela, ainda criança. Estava com ares mais jovens, com um longo vestido branco reluzente, dizendo palavras bonitas. E só. Tem gente que falava que ela ainda estava vagando por aí; outros falavam que ela estava num “hospital espiritual” recebendo cuidados. Nem sei. Dizem que ela era uma pessoa triste e que dizia ter “nascido com a estrela, só que apagada”. Mas foi essa avó que meu deu amor, acalanto e que junto com meu avô contribuíram para uma boa parte do que sou hoje. Foi exatamente por esse motivo que, logo após sua morte, chorava pedindo para morrer junto.

Nunca recebi uma carta, um psicografia, um olá dela. Também não fiquei buscando, não fiquei correndo centros espíritas para que ela mandasse mensagens. Mas frequentei vários, e nunca tive sequer uma notícia. Tenho uma névoa de bem estar que me ronda ao pensar nela, mas nada realmente concreto, nenhuma experiência sobrenatural de reencontro. Nessas horas, isso me faz duvidar um pouco de tudo aquilo em que acredito.

E daí eu fico reparando nas pessoas que ainda têm ou tiveram essas avós que eu tanto queria pra mim. Aquela avó que faz a comida, esperando o neto chegar; aquela que costura uma roupa à mão, que faz um cachecol, que faz a sobremesa predileta dele. Aquela que dá um dinheirinho enrolado no dia do aniversário, que vai buscar na escola, que tem um amor diferente daquele quase obrigatório entre pais e filhos. Os avós amam seus netos porque amam. E também não amam quando não querem amar.

Vejo o Pedro, meu sobrinho sendo amado pelas avós, espalhando um rastro de coisa boa por onde passam essas relações. Não pede e nem exige que seja amado, apenas é. Vejo tantas outras avós beijando e acariciando seus netos; vejo netos “fugindo” para a casa de suas avós em busca de um afeto descompromissado e leve. Definitivamente é pra isso que servem as avós: amor livre.

Sant’Ana, a mãe de Maria é a avó de todas as avós. Seja Sant’Ana ou Nanã, como na Umbanda ou no Candomblé é avó, mãe das mães, avó das avós que distribui amor livre e a serenidade das velhas que já foram esposas, mães e agora são avós. É ela quem guarda a serenidade da cabeça de filhos e netos; ela que representa o aspecto transformador das coisas; a chegada da sabedoria, da consciência. É a guardiã dos lagos e lagoas, das águas calmas, da paciência. É a ela que pedimos que interceda pelos filhos, pelas guerras de santos, pois é ela que “mima” os filhos e netos; é a avó que quebra o galho do neto, que convence a mãe a deixar o garoto viajar ou comer o doce antes do jantar. Não é nem um pouco à toa que sua cor é o roxo, da sabedoria, da iluminação, da transformação das energias e sentimentos.

Mas será que deixarei de sentir saudades da Vó Izolina se Nanã Boruquê vier colocar a mão sobre minha cabeça ou meus ombros? Não sei. Sei que vou ficar honrado e feliz com a aparição, mas não sei se preencherá esse vazio, essa necessidade de tê-la, de revê-la, de abraçá-la.

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