Blog do Doutor Fofinho

"Tudo começou há algum tempo atrás na Ilha do Sol..." Há muitos anos eu montei esse blog, dando o nome "Le Cul du Tabou", inspirado por uma amiga, para falar sobre o tabu das coisas. Ganhei muitos seguidores, mas desde 2018 não escrevi mais nele. Estou retomando, agora com novo nome, o "Blog do Doutor Fofinho", muito mais a minha cara, minha identidade. Sejam bem vindos.

Monday, May 12, 2014

REFLEXÃO SOBRE A SEMENTE DA INSEGURANÇA PLANTADA POR PAIS NEURÓTICOS EM SEUS FILHOS.*

(* Esse texto foi escrito por um paciente meu, que não desejou se identificar, mas pediu que eu publicasse o texto em meu blog para que pudesse ajudar as pessoas com seu texto-desabafo. Tem 32 anos, paulsita, é  Professor e Empresário)
São sete horas da manhã de um domingo de sol e estou super sonolento, então desperto entre os berros da vizinha.
“Gabriela, saia daí!”
“Gabriela, já mandei parar!"
Gabriela, não faça isso! Gabriela, não corra, não viva, não brinque, não fale, não se movimente, não me dê trabalho. Para o meu assombro, escuto mais um berro. “Gabriela, sua vagabunda, te falei que não era para fazer isso, você vai apanhar!”
Gabriela é apenas uma menina indefesa, com menos de três anos de idade. Os vizinhos falam que ela tem Síndrome de Down, e já reclamaram para a síndica dos berros de sua mãe descompensada. Os gritos ardidos com a pequena vêm das janelas do apartamento do bloco ao lado do de um amigo onde estou hospedado num final de semana quase agradável. Os berros me remetem ao meu passado triste, quando era acordado por Mamãe, também aos gritos. "Acorda, seu vagabundo! Vai procurar emprego”. Assim, sem “bom dia!”, com uma dose de raiva, de rancor. Fingia não perceber e nem ligar, mas com tanto berro e com tanta falta de carinho e compreensão, tanta falta de respeito me transformei num adulto inseguro. Sabia que o problema não era comigo de fato e que estava pagando pelos tormentos de uma Mãezinha neurótica. Filho sente, nossa e como sente. Sentia que, se pudesse, minha mãe me acordaria com pontapés.
Meu padrasto certa vez esmurrou a porta do banheiro. Ele queria usá-lo e como sempre tinha a prioridade. Com a sua superioridade e arrogância, achava-se superior e melhor que todos em casa. Eu estava apenas me arrumando, penteando meus cabelos. Sempre fui vaidoso. Acredito até hoje que é importante se apresentar bem nos lugares. 
Ele gritou, “Saia daí sua bicha!” Eu moleque, no armário, pedindo todos os dias para Deus que aquele desejo não se manifestasse. O banheiro era meu armário também, com medo de apanhar ou ser expulso de casa, aos 14 anos de idade, sabia que não seria fácil. Gritou com raiva, para me humilhar. Fui colecionando uma série de apelidos e xingamentos até o dia que implodi.
Implodir fez com que eu procurasse ajuda e entendesse como alguém que foi feito para te dar carinho e amor pode levá-lo a tanto medo, dor e mágoa. Tanta insegurança por não dizer assim: “Filho eu te aceito como você é, e o mais importante e que sejas feliz!”
Tenho um amigo que sua mãe o levava no Carandiru, já bem pequeno, aos 5 anos de idade, para visitar o Pai, que era traficante de drogas e já tinha cometido 2 latrocínios. A mesma mãe, numa miséria danada dentro de casa, poucos pães, tirava o pouco que tinha dentro de casa, segundo Pedro, para dar para uma dessas igrejas neopentecostais, e pior que, para o meu espanto, a instituição aceitava o dizímo dessa pobre alma.
A Mãe de Pedro achava importante levar o pequeno inocente para ver o seu pai. Não sabia o mal que causava. Imagine você o que esse menino viu nas visitas ao presídio e o que ele me relatou ter aprendido lá dentro. Em plena formação de seu caráter, Pedro era exposto a sexo explicíto entre as frestas dos lençóis, usuários cheirando, fumando e bebendo, assaltantes, estupradores e,em meio a tudo isso, reuniões familiares afetuosas com aroma de cravo, rosas e mofo, muito mofo.
Meu amigo hoje está com 22 anos e aos 17 foi adotado por uma família, atualmente usuário de cocaína, está separado da sua mãe de sangue como ele gosta de dizer, tem transtorno obsessivo compulsivo e tenta ser feliz num quarto e sala mofado em Diadema, na grande São Paulo. Desempregado, conta com a ajuda de amigos para comer. Considero ele um sobrevivente.
E meu banheiro é digno de uma Diva!
Eu apanhei muito nessa vida até entender que ser feliz dá trabalho e que a chave é ter controle emocional. Desculpar-se, nutrir-se de coisas que você gosta de fazer, se divertir, são coisas que vão te levar para um lugar muito longe da dor emocional. Uma vez que você foi ferido por um algoz e esse pode ter sido seu pai ou sua mãe, as feridas demoram a cicatrizar e temo em dizer que talvez elas nunca cicatrizem.
Mas eu cresci e com o autoconhecimento, hoje me sinto seguro! Compreendi minha mãe e minha mágoa está sendo tratada. Fui muito agradedo por ser diferente. E hoje sei que a diferença não vem somente da sexualidade, basta você não ser como seus pais querem que você seja. Olho o movimento ao meu redor e vejo os pais refletindo em seus filhos todas as suas angústias e dificuldades. Projetando sonhos em seus filhos sem perguntarem se eles realmente desejam aquilo para suas vidas. Certa vez, um outro amigo, mais velho, pai de 3 filhos, me ensinou que única certeza da paternidade é que você vai errar mas que também é maravilhosa a experiência de ser pai.
Claro que eu respeito a maternidade e a paternidade, o que eu não respeito e aliás tenho horror e nem um pingo de tolerância  são os adultos que se metem a criar filhos sem planejamento e amor! Não entendo Deus nessas horas. Não sei se quero entender. Dar o poder da paternidade e maternidade para criaturas tão irracionais fazerem tanta maldade aos seus filhos. 
Pais neuróticos projetam suas aflições e destemperos em seus filhos, causando em suas vidas e em suas formações distorções da realidade. Eu posso falar por experiência própria porque tive muita dificuldade de convivência com meninos e meninas considerados “normais”, ou seja, heterossexuais, ou que foram criados com mães mais centradas e pais mais zelosos.
Filho é um projeto de vida, um benção de Deus para ser cuidado e educado com amor e respeito mesmo sendo diferente de qualquer padrão imposto por uma sociedade institucionalizada, preconceituosa e normativa. Não para que você projete sonhos e descarregue angústias e aflições, ou utilize como investimento para futuro.

Acredito que o caminho do sucesso para uma criança é educação e felicidade, e VIVA A  DIFERENÇA!

1 Comments:

Blogger Mari A. Nassif said...

Válido testemunho, importante inclusive para não repetir os padrões e ter papel de carcereiro quando, de verdade, o amor há de libertar. Chorei <3

11:37 AM PDT  

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