VIDA DE METROVIÁRIO

Já faz algum tempo que oficializei as minhas quartas-feiras como o “dia diferenciado”, após estressantes experiências do insuportável trânsito da capital paulista ao voltar no final do dia de trabalho fora de São Paulo. Resolvi encarar o “busão”. E o resultado tem sido maravilhoso: saio um pouco mais cedo do que se fosse de carro, vou e volto dormindo no ônibus, e ainda sobra um pouquinho de tempo para ler, jogar e curtir o Facebook.
Uma coisa nesse percurso tem me intrigado muito: a cara feia dos metroviários. Toda vez que me dirijo às bilheterias do metrô, deparo com o mesmo tipo de cena. Um “bom dia” que não é respondido; um jeito estúpido de pegar o dinheiro naquele buraquinho estúpido na bilheteria; uma constante cara de azia que é irredutível com educação e sorrisos. Eu entendo que lidar com público é uma coisa difícil; andei fuçando na internet e eles têm salários realmente baixos. Mas se fosse assim, os faxineiros seriam todos infelizes. E os coveiros então? Nem se fala.
Hoje, ao comprar o bilhete, teria apanhado do sujeito da bilheteria se não fosse o vidro que nos separava. Só porque dei uma nota de cinquenta reais. Ele falou que não ia ter troco. Eu fiquei ali, plácido, olhando para a cara dele, assobiando uma música da Bethânia. E ele saiu, batendo nas paredes, raivoso, procurando o troco nas suas coisas. Jogou as notas, como se fizesse um enorme favor. Eu agradeci “budamente” e lhe desejei um bom dia.
Ao comprar o bilhete de volta (explico: comprei somente o bilhete de ida na ida porque não sabia que ia precisar da volta), me embaralhei com a contagem das moedas e o moço enjaulado puxou as moedas com força e se irritou com a minha falta de perspicácia. Enjaulado. É isso. Antes eu achava que a jaulinha das bilheterias servia de segurança para eles. Hoje tudo me leva a crer que a jaula é para proteger os usuários dos ataques dos metroviários.
Tudo bem, o salário é baixo. Parece que ronda os mil e quinhentos reais. Mas ninguém nasceu metroviário. Nenhum pai ou mãe sonhou em ter um filho metroviário, principalmente da estirpe que vende bilhetes de metrô.
Mas a minha faxineira ganha mais que um metroviário.
Hoje estive numa festinha de despedida de uma faxineira de um ambulatório público e acredito que ela ganhe a metade ou até um terço do que ganha um metroviário. E estava feliz, agradecendo por ter tido a oportunidade de trabalhar naquele lugar. Ela estava mudando de emprego, provavelmente para ganhar um pouco mais, ainda assim menos do que um metroviário.
Eu tinha uma vizinha que contratou, numa certa época, os serviços de um “faxineiro”. Um quarentão boa pinta, pai de família que, vendo-se desempregado e diante da dificuldade de ser recolocado, começou a fazer faxina em casas de família. Fazia o serviço tão bem e com tanta alegria que sua fama se espalhou pelos arredores e seus serviços passaram a ser disputadíssimos. Sem concurso público, sem carteira assinada, sem o tão esperado “resistro”. Mas com dinheiro no bolso e um sorriso na cara.
Os metroviários ranzinzas fizeram com que eu me lembrasse dos funcionários mal humorados das repartições públicas. Teve uma vez que fui à Secretaria da Saúde para buscar um raio de uma receita. A secretaria funcionava até dezesseis horas e eu cheguei faltando quinze minutos para encerrar o expediente. Ocorreu que ninguém vinha ao balcão para me atender e percebi que os funcionários se escondiam numa sala e desviavam do balcão para não me atenderem. Passados dez minutos, comecei a chamar cada pessoa que passava, até que um deles se encorajou e disse: “Estamos fechando”.
Contrário aos meus modos habituais, dei um soco no balcão e comecei a gritar, dizendo que o expediente ainda não estava encerrado e que já estava esperando havia algum tempo e que, caso não fosse atendido, queria falar com um superior. E veio uma médica com a cara mais fechada do universo me atender, como se estivesse fazendo uma caridade.
Que escolhas são essas? Claro que cada um tem direito a escolher o caminho, a profissão e o trabalho que bem entender, seja metroviário, coveiro, faxineiro ou prostituta ( que, aliás, costuma ganhar bem mais do que todos esse outros juntos...). E é compreensível que uma pessoa não esteja nos seus melhores dias e que não esteja distribuindo sorrisos; mas tem-se sempre a opção de abandonar aquela jaula em busca de dias mais felizes.
Enfim, se a vida de metroviário é muito pior do que a vida de cachorro, qual a graça de escolher a própria desgraça?
3 Comments:
Excelente o texto DR. Fofinho. Compre um bilhete único, é o máximo!
Ah!!!! O Bilhete Único! Duro é a fila!
Desculpa, mas um bilheteiro do Metrô, que é o cargo mais baixo da operação, ganha bruto quase R$2000,00.
Ou sua empregada é que ganha bem demais!!!
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