ME DEIXA SER BURRO! (Inspirado na frase de Aline Dorel, personagem de Grace Gianoukas do Terça Insana)

Deus! Como estou cansado de ser sagaz, de compreender as coisas, de antever, de perceber, de voltar com o fubá antes do milho. Sim, pode ser útil em algumas horas, mas dá uma canseira a maior parte do tempo. É ótimo quando estou trabalhando em meu consultório, pois isso tem ajudado a vida de muita gente; mas no dia a dia, no cotidiano, tem me dado uma preguiça danada. Faz minha pressão subir, me faz perder mais cabelos.
Também não quero saber de política. Não me interessa se a Globo derrubou o Lula, se o Kassab roubou, se a Dilma também. Porque ainda não conheci nenhum político eleito de nenhum partido que não estivesse envolvido em algum tipo de falcatrua. Parece que o ponto de corte é a subida para o poder. Subiu, roubou. Ou pelo menos ficamos sabendo disso somente quando sobem. Collor, Lula, Maluf, Dilma, Serra, Kassab, Marta e tantos outros. Alguém é capaz de dizer pra mim quem é mais ladrão? Ninguém. A única diferença entre eles é que roubam para quadrilhas diferentes. E às vezes nem isso.
E o Estado laico, a Marcha Anti-Homofobia, a usina de Belo Monte, os boicotes, os abaixo-assinados. Uma enxurrada de coisas que temos que ler, pensar, opinar, assinar, participar. E as criticas, as divergências, as polêmicas? Que cansaço.
Criei meu perfil no Facebook a pedido de uma amiga, para me tornar seu vizinho em Farmville. Viciei naquela bagaça. Até ficar com tendinite de tanto colher frutos, ordenhar vacas e pentear animais. E então começaram a vir os presentinhos inadequados, as solicitações para novos jogos. Cansei. Vendi tudo e transformei a fazenda num lindo jardim. Cansei também e desativei a fazenda. E agora bloqueio todos os jogos que aparecem na minha frente.
Daí vieram as citações ignorantes. Gente replicando, compartilhando, alastrando frases “new age” atribuídas a grandes personalidades: Drummond, Clarice Lispector, Gandhi, Buda, Chaplin, João Cabral de Melo Neto, Nietzsche. Até a poesia ridícula da Maitê Proença virou frase de Clarice. Por um tempo, fiquei perseguindo um conhecido que vivia postando essas frases pífias. Pior de tudo: era a página “UOL Pensador” que fazia ele pensar que era erudito. Na ignorante fantasia contemporânea de pretensa sabedoria, até “Marcha Soldado” vira frase de grande estadista. Cansei de combater a mediocridade; estava apagando incêndios com xicrinhas de porcelana. A avassaladora marcha da ignorância massacra toda e qualquer intenção culta.
E agora tem a censura. Vivemos à sombra de uma ditadura cretina imposta pelas próprias pessoas. Das opiniões. Dos sentidos. Dos rumos. O “politicamente correto” virou uma grande sombra sobre as cabeças de todas as pessoas e hoje é proibido fazer piada sobre a maioria das coisas. Um dia me ensinaram que a piada, o chiste, o sarcasmo podem ser mecanismos de defesa para lidar com a tensão, com a adversidade, com a dor. Em meio a uma humanidade cada vez mais triste, mais sem rumo e mais sem perspectivas, o que se poderá fazer se não for mais permitido brincar?
As crianças não brincam mais; ficam confinadas em seus apartamentos minúsculos e seus videogames. A Ritalina deixou há tempos de ser medicação para Hiperatividade; hoje é remédio para falta de educação e energia acumulada; se a criança não pode mais brincar e nem ser livre, ela se tornará um adolescente infeliz e uma das poucas alternativas que lhe resta é “brincar” de atirar em seus pulmões as pedras que não atirou no rio. E os adultos, que brincam muitos menos, gastam seus tostões comprando calmantes e antidepressivos que os deixem mais aptos a uma vida tão sem graça.
Outro dia, ouvi o Ministro da Saúde dizendo que um número de brasileiros equivalentes à população do Canadá “entrou” para a classe média, aumentou seu poder de compra se entupindo de crediários e cheques especiais; paga seus planos de saúde que funcionam ainda menos do que o SUS, compra carros que entopem as avenidas e ficam boiando com as enchentes nas mal projetadas ruas e avenidas das grandes cidades. É como liberar a catraca do metrô na hora do “rush”: a tal da classe média é uma sufocante massa de gente amontoada, endividada e infeliz.
Mas o que o Ministro não disse é que uma montoeira de gente talvez maior do que a população do Canadá migrou pra linha da mais absoluta miséria e degradação: os zumbis do crack se proliferam por todos os cantos desse país. E como conter essa proliferação: vamos enfiar todos em clínicas, comunidades terapêuticas, asilos, abrigos. Vamos limpar as ruas dessa gente, rápido, rápido, rápido. Antes que cheguem a Copa e as Olimpíadas. País bom é pais limpo.
Daí o pessoal se incomoda com as piadas que fizeram sobre o tratamento de câncer do Lula. Confundiram tudo. (Quase) ninguém estava zoando com a sua doença, muito embora houvesse um montão de gente que o preferia bem mortinho. O que uma massa de pessoas desejava era que ele experimentasse um tratamento nesse sistema público que ele e sua comparsa alegam ser tão maravilhoso e funcional. Uma metáfora. Uma sátira. Nada mais. Um montão de gente se pôs a defendê-lo e a defender o SUS. É lógico que existem centros públicos de excelência para tratamento de câncer e de outras tantas doenças. Mas é muito mais lógico e verdadeiro lembrar que a grande maioria das pessoas, principalmente aquelas que moram distantes dos grandes centros, morrem à míngua, de fome, de câncer e de sede.
Outro dia eu estava pensando: quando eu era pequeno, ouvia falar da seca no Nordeste. Hoje ninguém fala mais da seca. Acabou? Irrigaram o Nordeste inteiro? Virou tudo laranjal? A seca continua lá. E tem gente que continua indo trabalhar na Somália e outros cantos da África acudir aquela gente toda. Médicos do Mundo, Medicina sem Fronteiras, Cruz Vermelha e tantas outras. E o Nordeste continua seco. E as crianças continuam morrendo de fome, seca e desidratação.
Todo esse desabafo pra dizer que eu quero que o meu Facebook seja um lugar de diversão, uma praia, uma praça, uma casa no campo. Onde eu possa encontrar meus amigos, trocar idéias, dar risadas e até chorar vez ou outra.
1 Comments:
e nada mais!
Post a Comment
<< Home