Blog do Doutor Fofinho

"Tudo começou há algum tempo atrás na Ilha do Sol..." Há muitos anos eu montei esse blog, dando o nome "Le Cul du Tabou", inspirado por uma amiga, para falar sobre o tabu das coisas. Ganhei muitos seguidores, mas desde 2018 não escrevi mais nele. Estou retomando, agora com novo nome, o "Blog do Doutor Fofinho", muito mais a minha cara, minha identidade. Sejam bem vindos.

Thursday, February 04, 2016

TE AMO, MÃE YEMANJÁ


* imagem de Yemanjá retirada do site http://artedearuanda.blogspot.com.br/2012/05/iemanja.html

Houve um tempo em que eu te repudiava. Achava que era por causa dos seus peitos grandes e caídos, porque arrastava pescadores inocentes para o fundo do mar com seu canto ou mesmo porque roubava os homens das suas filhas, deixando-as solteiras e mal sucedidas nas matérias do coração. Mentia. Eram apenas histórias que ouvia e fingia acreditar. Também não sabia compreender a sua grandeza. E pra mim, toda mulher, toda a cidade tinha quer ser filha da mãe das outras águas, as doces.

Foi quando minha amiga, filha sua, estampou igual bofetada uma verdade inconteste na minha cara lavada: eu não te amava porque tinha problemas com a maternidade, com a maternagem e todo esse monte de atributos e expectativas que depositamos na chamada arquetípica Grande Mãe. Faltou sim o carinho legítimo, faltou não ser usado, faltou ser protegido do monstro que me perseguia noites e dias, faltou ser defendido de ser roubado, faltou dar-me segurança. Não de você, mas da criatura que deveria ser a depositária dessa figura com seus atributos. Faltou tanta coisa. Faltas.

Demorei anos e idas e vindas às terapias para poder compreender que ninguém pode dar o que não tem, e mais anos ainda para poder perdoar essa falta advinda da impossibilidade. Foram embora a mágoa e o ódio que faziam sombra à sua aparição. Ficaram, como disse uma vez um dos mestres das terapias, as cicatrizes dos sofrimentos passados. E Deus pode enfim me presentear com a serena visão da sua face, do seu olhar sobre mim, da sua mão afagando silenciosamente a minha cabeça.

Deus, não o Deus supremo que tudo pode e tudo vê, mas o deus-em-mim, o todo-poderoso instinto da minha consciência que habita o fundo da minha alma.

Foram necessárias muitas peregrinações a sua primeira morada em Terra Brasilis, a Bahia de Todos os Santos, para aprender a te amar, respeitar e te aceitar como Mãe Suprema. Jamais esquecerei  o dia em que, estonteado pela sua vibração de amor e dando ouvido aos seus sussurros de mãe, desci as escadarias de seu palacete no Rio Vermelho e fui dar de encontro ao mar, o fabuloso jardim da sua morada.

Foi ali, Mãe, que a Senhora me presenteou com o presente dos presentes, a minha própria cabeça. A minha cabeça, tão sua, e me devolvia refeita, renovada ou, melhor dizendo, feita. Feita naquele momento em coral negro, para que eu lembrasse do Caboclo Pedra Preta. Feita negra para que eu lembrasse desse meu reencontro com essas origens africanas. Um coral preto, negro, embreuzado, ebanoide para lembrar o quanto essa cabeça pertence a esse grande pai negro, meu Pai Xangô.

Hoje eu caminho esses caminhos segundo seus desígnios e não me arrependo de nenhum passo dado, exceto por não ter começado antes essa minha jornada e ter me desviado ou parado tantas vezes.

Hoje minha cabeça e meu coração são seus. Da Senhora e de meus Orixás.


Te amo, Mãe Yemanjá.

2 Comments:

Blogger vida real said...

Que linda homenagem!

1:08 PM PST  
Blogger júlia said...

lindo marcelo!

6:30 AM PST  

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