Blog do Doutor Fofinho

"Tudo começou há algum tempo atrás na Ilha do Sol..." Há muitos anos eu montei esse blog, dando o nome "Le Cul du Tabou", inspirado por uma amiga, para falar sobre o tabu das coisas. Ganhei muitos seguidores, mas desde 2018 não escrevi mais nele. Estou retomando, agora com novo nome, o "Blog do Doutor Fofinho", muito mais a minha cara, minha identidade. Sejam bem vindos.

Tuesday, March 04, 2008

TIA LAILA

Minha tia Laila, irmã de minha mãe, era uma perua convicta e passou a vida inteira dando suas aulinhas na pré-escola para pagar seus brincos, anéis e colares. Seu marido, meu tio Dagoberto, nunca permitiu que ela usasse seu dinheiro para o sustento da casa.

Tia Laila nunca foi chegada em prendas domésticas. Passava o dia na rua, indo a shoppings, lojas de roupas, confecções novas. Sua casa era governada por empregadas. Até que deu sorte, porque durante anos teve uma empregada muito boa, que limpava, lavava, passava, cuidava dos meus primos, dos dez cachorros, dos coelhos e das galinhas. Seu nome era Zazá. Era uma negra corpulenta e cheia de energia. Um dia chegou na casa de minha tia toda feliz, dizendo que ia ser contratada para ser “mulata do Sargentelli”, um velho sambista que selecionava negras portentosas para dançar mundo afora. Todo mundo zombou de Zazá:

- Onde já se viu, você, gorda desse jeito, ser mulata do Sargentelli! Eles vão levar você é pra trabalhar de escrava na África, isso sim! – dizia tia Laila.

Mas Elza não se fez de rogada. Aceitou o tal emprego, ficou internada num “spa”,perdeu mais de trinta quilos. Em três meses estava de viagem marcada para o Japão para sambar para os japoneses. E nunca mais voltou, exceto três anos após para fazer uma visita e levar presentes para meus primos.

E a casa da tia Laila nunca mais foi a mesma. Nenhuma empregada parava lá, todas reclamavam do excesso de trabalho. Houve um tempo em que minha tia contratou duas empregadas e mesmo assim não dava certo. Ninguém tinha a energia e a boa vontade de Zazá.

Numa certa época minha tia não arranjava ninguém para trabalhar lá e ela se recusava a fazer as tarefas domésticas. Contratou uma cozinheira que fazia congelados para o mês inteiro e meu tio teve a idéia de pagar meus primos por cada serviço realizado. Criou uma tabela de preços e cada serviço executado tinha que ter o visto de minha tia. É claro que não deu certo. Cada um deles lavava o carro e passava o aspirador várias vezes por dia, de forma que a única coisa que meu tio ganhou foi um baita prejuízo.

Continuaram sem empregada e minha tia resolveu abrir mão da ordem em casa. Ficou tudo em pandarecos. Coisas jogadas pelo chão, poeira pelo caminho. O único lugar que ela se dava o trabalho de limpar era a cozinha e o quarto dela, porque eram os lugares por onde meu tio transitava quando chegava do trabalho.

O tempo foi passando e a situação ficava cada vez mais caótica. Mas o pior ainda estava por vir. A casa de minha tia ficava na Serra da Cantereira, na região norte de São Paulo, cercada de mato e bichos por todos os lados. Em sua casa, que era muito grande, havia uma sala de televisão muito aconchegante, com lareira, tapete fofo e muitas almofadas.

Nessa época da “greve de limpeza”, ninguém aparecia por lá. Meus tios e meus primos preferiam se enfronhar nos seus quartos e na cozinha ou sair de casa para não lidarem com a sujeira da casa. Mas um dia minha tia resolveu cochilar na sala de televisão. Chegou lá e foi ajeitar as almofadas para deitar no tapete e....

- Ahhhh!!!!! Socorro!!!! Socorro!!!! – ela gritava desesperadamente por ajuda.

Mas acho que a cobra que estava debaixo da almofada ficou mais assustada que ela e sai correndo para se enfiar atrás de uma estante. Quando minha tia levantou o resto das almofadas, entendeu o que aquela cobra fazia ali: debaixo da outra almofada havia cascas de ovo quebradas e uma meia dúzia de cobrinhas recém-nascidas.

Foi então que tia Laila parou para pensar no que estava acontecendo naquela casa. Fazia meses que ninguém limpava a casa como se deve e pior, meses que ninguém aparecia naquela sala. Para que tanto espaço, se ninguém usa? Então tia Laila tomou uma decisão: vendeu a casa e com o dinheiro comprou um minúsculo apartamento pra ela e meu tio e outros três para cada um de meus primos. Contratou uma empregada, agora muito mais fácil de achar e determinou que cada um cuidasse realmente do seu espaço.

PARABÉNS, FORMANDO!!!

Noite quente de dezembro. Frederico se preparava para a festa de formatura. Smoking, gravata borboleta, anel de formatura que ganhara de sua mãe. Gel no cabelo, barba feita, perfume importado. Enfim, tudo o que tinha direito para comemorar essa vitória em sua vida.

Chegou ao salão de festas de braços dados com a mãe. Frederico era um rapaz tímido, retraído, nunca havia namorado, apenas beijado umas menininhas aqui e acolá que, segundo seus amigos, isso só teria acontecido porque eram meninas muito desinibidas, pois se dependesse de Frederico, nada aconteceria.

A festa estava esplendorosa. Decoração perfeita, música boa, cheia de pessoas. Encontrou os colegas da faculdade, que logo lhe ofereceram bebida. Uísque importado, trazido pelo pai de um de seus colegas. Frederico recusou. Não estava acostumado a beber e nas poucas vezes que havia bebido, passara muito mal. Tudo estava muito legal, mas ele não se sentia feliz. Sentia um vazio ao ver todas os amigos e amigas com seus respectivos pares e ele sempre sozinho. Sentia de fato uma pontinha de inveja ao ver as pessoas se beijando, se abraçando enquanto ele se consolava de mãos dadas com a sua mãe. Dava voltas pelo salão, ria forçadamente com os amigos, mas em seu íntimo sentia que lhe faltava isso. Faltava alguém para amar.

Veio a valsa dos formandos. Dançou duas com a sua mãe e a última com a mãe de sua amiga Júlia, de quem havia sido sempre amigo e confidente. Acompanhou toda a trajetória emocional de Júlia, seus desencontros amorosos, seus namorados traidores, seus sofrimento. Em certa época chegou a pensar que estava apaixonado por ela, mas percebeu que era apenas a intimidade de dois grandes amigos e os comentários de seus colegas que incutiram essa idéia errada em sua cabeça.

E à medida que as pessoas iam ficando mais e mais alegres, Frederico se sentia cada vez mais triste e isolado em seu mundo de solidão. Não suportando aquela angústia num momento em que deveria estar alegre como todas as outras pessoas, foi ao banheiro lavar o rosto para ver se “despertava”. Lavou-se, molhou o cabelo, a testa, a nuca. E enquanto se lavava, imaginava-se sendo beijado e acariciado por alguém sem rosto, sem nome. “Preciso tomar alguma coisa”, pensou. Saiu do banheiro e foi direto ao encontro da garrafa de uísque. Tomou rápido um gole e em poucos minutos começou a sentir-se mais leve, menos angustiado. Logo sentiu ânimo para dançar e se juntar aos amigos para dar risadas.

Num intervalo da banda, os amigos se juntaram em semi-círculo para papear. Após algum tempo chegou Fernando, um de seus amigos. Ao seu lado estava um cara que Frederico nunca tinha visto. Não era da faculdade e nem era algum dos amigos conhecidos de Fernando. Na verdade era um primo dele. Seu nome era Marcos. Fernando o apresentou a todos e ele, educadamente foi cumprimentando um a um das pessoas da roda. Tinha os cabelos negros, brilhosos e um pouco ondulados, com uma franja que pendia sobre seu rosto. Seus olhos eram negros e profundos e seus lábios eram carnudos e avermelhados, ornando muito bem com sua pele morena.

Frederico não se continha e não conseguia parar de olhar para Marcos. Estava sentindo algo que nunca havia sentido antes, como se estivesse inebriado pela presença marcante daquele sujeito. De repente, Marcos se aproximou de Fernando e, diferentemente dos calorosos apertos de mão que deu em seus outros amigos, abraçou Frederico como se fossem muito íntimos e, apoiando fortemente as mãos em suas costas, encostou a boca carnuda em seu ouvido, dizendo: “Parabéns, formando!”.

Marcos demorou alguns segundos que pareceram uma eternidade para Frederico. Sentiu o calor do corpo dele contra o seu, sentia o seu perfume invadir seus sentidos. Uma onda de arrepios invadiu o seu corpo. Marcos se afastou vagarosamente de Frederico e, de longe, lhe deu uma piscada, daquelas que só os cafajestes sabem dar.

Continuaram naquela rodinha conversando. Passado algum tempo a música recomeçou e foram todos dançar. Marcos dançava com todas as meninas do grupo, mas cada vez que seus olhares se cruzavam, Marcos piscava novamente para Frederico. Duas ou três músicas se passaram e Marcos saiu da pista de dança. Passou por Frederico e apertou fortemente seu braço, como quem lhe desse um sinal de alguma coisa.

Frederico não sabia o que fazer. Sentia apenas um calor extremo percorrendo o seu corpo, as pernas bambearem, o coração quase pulando pela boca. Correu para a mesa e tomou mais uísque. Percorria o salão com os olhos para ver se encontrava Marcos. Pensou que ele pudesse estar com alguma garota. Depois pensou que talvez aquele aperto em seu braço pudesse significar um convite. Saiu apressado em direção ao banheiro. Entrou e ficou um tempão observando o entra e sai das cabines das privadas, esperando que Marcos saísse de uma delas, ou abrisse a porta lhe convidando.

Fechou os olhos e ficou imaginando seu beijos, seus apertos, suas mãos fortes contra seu corpo e seu perfume. Pólo, de Ralph Lauren. Jamais esqueceria aquele cheiro. Passado algum tempo, se deu conta de que Marcos não estava lá. Pensou que havia perdido o “timing” desse encontro. Mas estava tão cheio de desejo, um desejo que estava adormecido há séculos e que agora despertava, feito um dragão faminto. Entrou na cabine do banheiro sozinho e, perdido na imaginação, começou a se masturbar. Com a gravata limpou o suor da sua testa e esfregou-a em seu pescoço para extrair de sua pele o cheiro do perfume de Marcos. Ele ainda estava lá. E roçando a gravata em seus lábios, sentindo aquele cheiro de homem que lhe invadia a alma, Frederico gozou como nunca havia gozado antes.

Ficou estatelado por alguns minutos, quase dormindo, como se tivesse transado por toda uma noite. Acordou assustado com pessoas batendo na porta da cabine para que liberasse a “vaga”. Saiu, cambaleante de orgasmo e uísque.

Ao sair do banheiro, viu Marcos beijando uma de suas amigas. Sentiu seu peito rasgar, aproximou-se do casal para ver se ele fazia algum novo gesto lascivo. Nada. Parecia que Marcos nem o reconhecia. Resolveu ir embora e decidiu despedir-se de Marcos, na esperança de obter uma palavra, um indicativo qualquer, mas ele havia desaparecido.

Já em casa, Frederico sentia a cabeça rodar, estava bêbado. E enquanto rodava, todas as imagens daquela noite passeavam pela sua cabeça. Os olhos, a boca, o cheiro, as mãos. Tudo de Marcos não deixavam de rondar seus pensamentos, chegando em flashes incômodos em sua cabeça bêbada. Dormiu de cuecas e de gravata borboleta.

Acordou e voltou a pensar no acontecido. Será que havia imaginado tudo isso? Será que havia fantasiado as atitudes de Marcos ou interpretado erroneamente seus supostos sinais? Não era capaz de responder. Talvez tenha imaginado mesmo tudo aquilo, mas estava certo de que, mesmo sendo fruto da sua imaginação, todas aquelas sensações representavam um despertar, um desabrochar em seu coração e em sua mente.

Lembrou de uns pedaços de um texto de Nietzche, que dizia que têm certos caminhos em nossa vida e certas pontes que devemos atravessar que somos os únicos a conseguir trilhar. Sozinhos. A única coisa da qual tinha certeza é de que havia cruzado a tal ponte. E que a partir daquele ponto começava a trilhar uma nova estrada.

Levantou-se da cama, lavou o rosto. Passou a mão molhada em seu pescoço. O cheiro de Marcos ainda estava lá.

CASA DE REBOCO

Outubro de 2002. Fui para Recife a trabalho. Durante o dia trabalhávamos bastante, mas à noite, chegava a hora de perder a compostura. Cada noite íamos a um lugar diferente: bares, restaurantes, quiosques de praia. Foi quando duas amigas sugeriram que fôssemos dançar forró.

- Tô fora! – eu disse – Detesto forró! Prefiro ficar aqui no quiosque da praia.
- Ah...vamos, vai... Vai ser legal, tem um lugar que o pessoal do hotel recomendou, chama “Casa de Reboco”... é um lugar típico aqui....

Tanto insistiram que acabei indo com elas. No final, eram seis mulheres e apenas eu de homem. Pegamos dois táxis para acomodar todo mundo e quando já pensava que estávamos sendo enganados pelos taxistas devido à demora em chegar, avistamos a tal casa de forró. Era um bairro horroroso. Pobre, sujo, ruas de terra, casas populares, igrejas evangélicas. No meio de tudo isso, um galpão de cimento e uma fila na porta.

Realmente não era um lugar de turistas. Nem para turistas. Era um lugar rústico, sem nenhum tipo de preocupação com decoração ou estilo. Lá dentro, as pessoas dançavam, dançavam e, mal entramos, um bando de machos forrozeiros pularam em cima delas para dançar. Afinal, não é sempre que seis mulheres chegam praticamente desacompanhadas num lugar daqueles.

E lá se foram elas com os jagunços, dançando, sacodindo e, enquanto isso, fiquei tentando dar alguns passos com uma de minhas amigas. Após muitas risadas e pisões no pé, resolvemos desistir. Ficamos conversando e desatamos a contar as desgraças do passado de cada um. De repente, ouvimos uma gritaria. Vários dos jagunços se agarrando, mesas e garrafas voando pelo salão. Saímos correndo para a porta. O grupo de brigões veio em nossa direção. Corremos para o banheiro e chegamos à conclusão que morreríamos prensados lá dentro.

Os donos do lugar não permitiram que as pessoas saíssem sem pagar a conta e fomos com muito medo para a fila, temendo que sobrasse alguma bala perdida ou corte de facão. Nisso percebemos que nossa outra amiga havia desaparecido.

-Onde está ela? Será que aconteceu algo com ela? Ai, meu Deus, estou tão preocupada! – falava uma de minhas amigas
-Ela é maior de idade, vacinada e se não está aqui é porque é irresponsável. – disse eu.

Passado algum tempo, a amiga desaparecida chegou ao nosso lado na fila. Desesperada, minha amiga começou a gritar com ela:

-Onde você estava? O que aconteceu? Estava preocupada!

E ela, bêbada, disse:

-Calma, não aconteceu nada.... Não fica estressada! Eu fui pegar o meu cigarro que caiu lá no chão no meio da briga...
-Você ta louca? Não tem medo? – disse a outra.
-Calma, é só um homem que olhou para a mulher de outro homem...

E ficamos mais de uma hora na fila para pagar a conta. A briga acalmou, talvez minha amiga tivesse razão. Mas com certeza não piso mais em casa de forró.

THE BIG FUCKING LIAR

Ano Novo no Rio de Janeiro. Praia lotada. Alto verão. Uma turma “uniforme” de amigos fiéis, sanduíiiiiche natural e de falafel, muito biscoito Globo, uma cabana de guarda-sóis nos abrigando do Sol escaldante. Nada poderia dar errado. Mentira. Não que a vida tenha que ser sempre perfeitinha. Mas é duro de engolir quando tudo está tão perfeito e um piano cai em nossas cabeças. Como quando aqueles malditos urubus esbarram nas turbinas do avião e as fazem explodir (mas isso é outra história…..)

A verdade é que o azar está sempre à espreita, de mãos dadas com o destino, a nos pregar peças. E foi assim que nossa paz foi interrompida por um urubu. Chega Márcio, amigo da amiga de um amigo de um amigo e não sei mais o quê. E pior: traz amigos seus. Tinha passado a noite fervendo em uma dessas festas “alucinantes”, na acepção mais correta do termo. Uma chuveirada de Ecstasy e Cocaína. Chegou, ocupou cadeira que já tinha dono. Comeu do meu biscoito Globo. Tomou gatorades por nossa conta. Falava pelos cotovelos. E não apenas falava muito, mas falava muito lixo. Era praticamente um vomitador de letras contorcidas, que em meio aos contorcimentos, cuspia vantagens de suas viagens maravilhosas, tanto as de avião como as de drogas e suas peripécias sexuais mirabolantes. Narciso incorporou. E ali ficou.

O curioso foi o clima que se estabeleceu. Bizarro. Um silêncio angustiante, nauseante. Todos ou quase todos desconfortáveis com o parlatório. Após longa e tenebrosa, estadia em nossa barraca, Márcio decidiu partir. Tinha que descansar para se refazer para uma outra “balada forte”, em suas palavras. Foi ele deixar nossa “tenda”, suspiros aliviados e uma gargalhada coletiva (com lágrimas) invadiu nosso mundinho. Legal mesmo foi descobrir que o Gatorade ficou por nossa conta. Ainda bem que não tinha Perrier.

Esse encontro desconfortável terminou, mas a presença deles em nossas vidas não havia se esgotado. Lembrei-me quando viajava para a casa de praia de meu avô e, no caminho pisava em placas de piche. Lavava, raspava, esfolava. Mas as placas de piche demoravam a sair.


Passado alguns meses, encontrei o amigo que o convidara para chegar à nossa barraca. Sentamos em um bar com outras pessoas e ele, encantado com essa figura, disse que ele não poderia ir a uma festa que iríamos porque estava no Caribe. Seus olhos brilhavam ao falar dele, como era chique, famoso, influente e viajador. Não fiquei com inveja nem nada. Apenas não cabia na cabeça como alguém normal poderia ser tão encantado com alguém tão anormal. Na semana da tal festa, fui a um restaurante que costumo ir com frequência. Qual não foi minha surpresa ao encontrar o tal chatonildo por lá. Nossos olhares se cruzaram através de um espelho, e percebi que ele fazia um esforço para lembrar de mim e voltava varias vezes ao espelho para me encarar de novo e de novo. Sem o menor esforço, não fiz nenhuma questão de cumprimentá-lo ou solucionar a sua dúvida cruel. Ãs vezes, o melhor presente que podemos oferecer é o benefício da dúvida.

Uma semana após, esse amigo fez aniversário. Convidou todo mundo, inclusive o “tal” Márcio. Como meus ferrões de escorpião estavam mui afiados, tinha que destilar o veneninho basico para recuperar minha homeostase. Aproximei-me do meu amigo e, apontando para Márcio, perguntei: “Eu conheço aquele cara de algum lugar, quem é ele mesmo?”. Feliz e contente com meu interesse, meu amigo respondeu: “É o Márcio, aquele meu amigo…ele estava no Rio com a gente!”. E então destilei todo o veneno, de uma vez só: “Ah, bem que eu lembrava…. Encontrei-o num restaurante na semana passada, olhava para a cara dele e não conseguia me lembrar….”. A cara de meu amigo caiu no chão, branca feito uma folha de papel. Foi assim que desmascarei o tal amigo que, ao invés de ser sincero e dizer que não ia à tal festa e pronto, precisou mentir que estaria no Caribe.

Nunca mais encontrei o tal. Mas fiquei pensando numa coisa: por que as pessoas mentem tanto? E acredito que a verdade é sempre um Tabu. Não acho que seja certo mentir, mas nos dias de hoje, falar a verdade é sinônimo de burrice, de ingenuidade. Por mais contratempos que a mentira possa gerar, ela é universalmente aceita, pelo simples fato de que não podemos dizer o que pensamos ou desejamos, por medo da incompreensão ou da retaliação. Mas continuo achando que a mentira tem pernas curtíssimas….