Blog do Doutor Fofinho

"Tudo começou há algum tempo atrás na Ilha do Sol..." Há muitos anos eu montei esse blog, dando o nome "Le Cul du Tabou", inspirado por uma amiga, para falar sobre o tabu das coisas. Ganhei muitos seguidores, mas desde 2018 não escrevi mais nele. Estou retomando, agora com novo nome, o "Blog do Doutor Fofinho", muito mais a minha cara, minha identidade. Sejam bem vindos.

Wednesday, June 20, 2012

OBRIGADO, IEMANJÁ.


Escrevi esse texto para - e - sobre uma amiga, para mim mesmo e para a nossa  amizade. 

Na vida, a gente leva porrada de onde menos se espera. Não estou reclamando. Estou apenas explicitando o imprevisível e inefável fenômeno VIDA. Estamos nela. Mas a melhor das porradas é aquela que nos faz crescer. Como quando, na mitologia yorubana, Iemanjá pede ajuda a seu filho Xangô para tirar seu marido Okerê de sua frente para que ela encontre o mar. E ele, com a força do raio, parte Okerê ao meio. Foi assim que me senti: como Okerê, partido ao meio. Mas foi por uma boa causa. Foi pelas mãos de Xangô que se quebrou um escudo, uma muralha, para que Iemanjá pudesse ser liberada para ir de encontro ao mar, à profundidade, às origens.

Agora eu entendo esse seu enredo, Iemanjá. Agora eu entendo sua presença, sua aproximação nesse momento da minha vida. E como mãe de Xangô, não haveria outra senão a senhora, em pessoa, a dizer verdades duras para o filho teimoso. Quem além de sua própria mãe poderia desafiar o Rei de Oyó e lhe apontar um defeito?

Mas nós não somos donos da verdade. Nem eu, nem ela. A verdade não é um bem que se tem. A verdade é energia, que muda de direção, de cor, de tamanho. A verdadeira verdade não está ao alcance dos nossos olhos e ouvidos. Digo isso porque ela não estava certa ao dizer que não tenho amor por Iemanjá. Digo isso porque ninguém é capaz de dizer que eu não a compreendo.

E não há como ter raiva da mãe Iemanjá. Ela abriu o buraco no peito de Xangô, como quem cuida das feridas, removendo crostas, colocando remédios ardidos. E, como toda boa mãe, acariciando o filho depois. Isso não fez doer menos. Mas, somente depois de uma dor de dimensões enlouquecedoras, foi possível entender para que ela serviu.

Então agora eu compreendo que Iemanjá não foi a causadora. O vidro da poção mágica já havia sido quebrado; o rio já tinha nascido para ir de encontro ao mar. E era por isso que Iemanjá já tinha chegado. Era por isso que ela falava comigo nos búzios; assumindo-se como minha mãe; era por isso que ela finalmente se desvelara ante mim, outrora escondida pelos mantos da Oxum.  Do mesmo jeito que Xangô nunca havia me abandonado; era somente eu que havia dele me distanciado. Iemanjá é a mãe zelosa que esteve sempre por perto esperando o momento de dizer o que devia ser dito.

Eu ainda estou ferido. Eu ainda sinto uma dor, bem lá no fundo da alma. Mas desse caminho que se abriu para dar vazão a essas águas todas, não há mais volta. E nem eu quero voltar. 

1 Comments:

Anonymous Maria said...

Obrigada, obrigada, obrigada. À vida, à mãe, ao mar. E muito especialmente à você!

7:14 AM PDT  

Post a Comment

<< Home