SATURNINAMENTE
Saturninamente.
Faz um tempo que não consigo escrever textos para o blog. Muitos amigos e leitores têm me pedido que eu volte a escrever. Cheguei a me debruçar sobre o computador, ensaiei uns "rabiscos" eletrônicos e não saiu nada.
Lembrei de uma entrevista da Adélia Prado, que anunciava um novo livro depois de uns longos anos sem escrever, oito, se não me falha a memória. Não me lembro as exatas palavras dela. Mas ela dizia que havia sofrido muita pressão de convíveres, de editoras e que poderia até ter escrito alguma "qualquer coisa" para satisfazer o afã dos outros, mas estaria descompromissada consigo mesma.
Eu gostaria de conseguir escrever mais, mas a minha inspiração me abandonou por algum tempo. Ou ela não me abandonou e estava apenas guardada. Ou essa brasa que mantém acesa a minha vida e que dá fogo para minha inspiração está sendo consumida para aquecer outras tarefas necessárias. Ou jogaram água gelada sobre a brasa.
Talvez tenha sido issso. Água gelada sobre a brasa. Meu amigo diz que é o tal Saturno que ronda por um ano solar toda a minha existência! Tem noção do que é ter um planeta fazendo sombra sobre sua vida por um ano?
Quando jogaram búzios pela primeira vez para mim, eu descobri que eu era filho de Xangô. Dona Jamile, a mãe de santo, sempre finalizava o jogo com uma mensagem do astral e, nesse primeiro encontro, deu-me a mensagem de Xangô para que eu carregasse pra sempre em meu coração:
"Tens medo da chuva e das tempestades, dos temporais? A chuva serve para lavar, limpar, levar embora o que não presta mais; a chuva rega as plantas, irriga e afofa o solo, para que venha uma nova colheita, para que a prosperidade chegue."
Daí eu me lembrei do primeiro dia em que participei de uma reza que ela fazia para Xangô às quartas-feiras. Voltando exausto da faculdade, sem dinheiro e com fome, peguei um ônibus errado para ir para a casa dela e desci num lugar desconhecido. Não me lembrava do nome da rua e não tinha como falar com alguém para pedir o endereço.
Caminhando na escuridão da noite, por ruas estranhas, chorava enquanto entoava a única frase que conseguia lembrar do cantiga de Xangô que havia escutado no dia da gira de Umbanda:
"Se um dia eu perder a fé no meu senhor, que role essa pedreira sobre mim"
E consegui chegar, atrasado, mas ainda em tempo de pedir ajuda para esse meu Pai Xangô que acabava de (re-)conhecer.
Eu fiquei pensando o que ela me diria sobre a sombra de Saturno em meu ano. Quase escrevi "se ela estivesse viva", mas me lembrei que ela está viva, em algum lugar. E agradeço por ter tido a oportunidade de encontrar essa pessoa que me amparou num momento de extrema dificuldade.
Pensar nisso me confortou.
Porque, se de um lado a sombra de Saturno me tira energia, me acomoda e retira de mim aquela vitalidade toda, ele faz isso comigo para que eu me sente e espere. Espere e pense, reflita. E é o que mais tenho feito ultimamente: pensar.
Pensar nas pessoas que se afastaram; pensar na dor que senti por cada traição, decepção e desonra que passei nesse período; refletir sobre os excessos cometidos, sobretudo o excesso de confiança e de expectativa; refletir como fui infantil por acreditar e confiar cegamente em algumas pessoas.
Pensar que, em pouquíssimo tempo, minha vida mudou completamente. Fui iniciado no Candomblé no final de 2014, terminei um casamento de 12 anos no ano seguinte, me apaixonei e me casei pouco tempo depois e, com essas mudanças, mudaram-se todos os meus projetos de vida. Tudo ou quase tudo que era projeto de vida, de repente ficou diferente. Porque hoje, o que eu desejo para a minha vida, está muito mais em consonância com a minha alma.
Quem eu sou hoje está,ainda não totalmente, muito mais próximo do que eu desejo ser enquanto pessoa, enquanto homem.
A Sombra de Saturno me faz avistar, de dentro para fora desse lugar cavernoso, escondido e secreto, a imagem projetada de um porvir mais consonante com os desejos da minha alma.
Embora eu esteja me sentindo hoje cansado e mentalmente esgotado, essa convalescência me faz lembrar que esse vislumbre dos dias melhores sempre me manteve vivo e esperançoso, mesmo nos piores (e passados) dias da minha existência. E, muito mais importante do que ser apenas uma fagulha de esperançosa ilusão, eu consegui chegar aos lugares que eu desejei estar.
Sozinho ou amparado por mãos visíveis ou invisíveis, eu cheguei "lá". Essa "lá" que é um "aqui", onde me encontro hoje, mas também é um "lá" que é "lá" mesmo, um lugar especial no qual ainda não aportei, mas sei que chegarei.
Então eu sigo viagem. Eliminando bagagens desnecessárias para me tornar mais leve. Deixando para trás pessoas, coisas, mágoas, tristezas. Como no filme "Viagem para Darjeeling", só estamos mesmo prontos para seguir quando somos capazes de deixar para trás as coisas que não importam mais.
Merci, Saturne.
Faz um tempo que não consigo escrever textos para o blog. Muitos amigos e leitores têm me pedido que eu volte a escrever. Cheguei a me debruçar sobre o computador, ensaiei uns "rabiscos" eletrônicos e não saiu nada.
Lembrei de uma entrevista da Adélia Prado, que anunciava um novo livro depois de uns longos anos sem escrever, oito, se não me falha a memória. Não me lembro as exatas palavras dela. Mas ela dizia que havia sofrido muita pressão de convíveres, de editoras e que poderia até ter escrito alguma "qualquer coisa" para satisfazer o afã dos outros, mas estaria descompromissada consigo mesma.
Eu gostaria de conseguir escrever mais, mas a minha inspiração me abandonou por algum tempo. Ou ela não me abandonou e estava apenas guardada. Ou essa brasa que mantém acesa a minha vida e que dá fogo para minha inspiração está sendo consumida para aquecer outras tarefas necessárias. Ou jogaram água gelada sobre a brasa.
Talvez tenha sido issso. Água gelada sobre a brasa. Meu amigo diz que é o tal Saturno que ronda por um ano solar toda a minha existência! Tem noção do que é ter um planeta fazendo sombra sobre sua vida por um ano?
Quando jogaram búzios pela primeira vez para mim, eu descobri que eu era filho de Xangô. Dona Jamile, a mãe de santo, sempre finalizava o jogo com uma mensagem do astral e, nesse primeiro encontro, deu-me a mensagem de Xangô para que eu carregasse pra sempre em meu coração:
"Tens medo da chuva e das tempestades, dos temporais? A chuva serve para lavar, limpar, levar embora o que não presta mais; a chuva rega as plantas, irriga e afofa o solo, para que venha uma nova colheita, para que a prosperidade chegue."
Daí eu me lembrei do primeiro dia em que participei de uma reza que ela fazia para Xangô às quartas-feiras. Voltando exausto da faculdade, sem dinheiro e com fome, peguei um ônibus errado para ir para a casa dela e desci num lugar desconhecido. Não me lembrava do nome da rua e não tinha como falar com alguém para pedir o endereço.
Caminhando na escuridão da noite, por ruas estranhas, chorava enquanto entoava a única frase que conseguia lembrar do cantiga de Xangô que havia escutado no dia da gira de Umbanda:
"Se um dia eu perder a fé no meu senhor, que role essa pedreira sobre mim"
E consegui chegar, atrasado, mas ainda em tempo de pedir ajuda para esse meu Pai Xangô que acabava de (re-)conhecer.
Eu fiquei pensando o que ela me diria sobre a sombra de Saturno em meu ano. Quase escrevi "se ela estivesse viva", mas me lembrei que ela está viva, em algum lugar. E agradeço por ter tido a oportunidade de encontrar essa pessoa que me amparou num momento de extrema dificuldade.
Pensar nisso me confortou.
Porque, se de um lado a sombra de Saturno me tira energia, me acomoda e retira de mim aquela vitalidade toda, ele faz isso comigo para que eu me sente e espere. Espere e pense, reflita. E é o que mais tenho feito ultimamente: pensar.
Pensar nas pessoas que se afastaram; pensar na dor que senti por cada traição, decepção e desonra que passei nesse período; refletir sobre os excessos cometidos, sobretudo o excesso de confiança e de expectativa; refletir como fui infantil por acreditar e confiar cegamente em algumas pessoas.
Pensar que, em pouquíssimo tempo, minha vida mudou completamente. Fui iniciado no Candomblé no final de 2014, terminei um casamento de 12 anos no ano seguinte, me apaixonei e me casei pouco tempo depois e, com essas mudanças, mudaram-se todos os meus projetos de vida. Tudo ou quase tudo que era projeto de vida, de repente ficou diferente. Porque hoje, o que eu desejo para a minha vida, está muito mais em consonância com a minha alma.
Quem eu sou hoje está,ainda não totalmente, muito mais próximo do que eu desejo ser enquanto pessoa, enquanto homem.
A Sombra de Saturno me faz avistar, de dentro para fora desse lugar cavernoso, escondido e secreto, a imagem projetada de um porvir mais consonante com os desejos da minha alma.
Embora eu esteja me sentindo hoje cansado e mentalmente esgotado, essa convalescência me faz lembrar que esse vislumbre dos dias melhores sempre me manteve vivo e esperançoso, mesmo nos piores (e passados) dias da minha existência. E, muito mais importante do que ser apenas uma fagulha de esperançosa ilusão, eu consegui chegar aos lugares que eu desejei estar.
Sozinho ou amparado por mãos visíveis ou invisíveis, eu cheguei "lá". Essa "lá" que é um "aqui", onde me encontro hoje, mas também é um "lá" que é "lá" mesmo, um lugar especial no qual ainda não aportei, mas sei que chegarei.
Então eu sigo viagem. Eliminando bagagens desnecessárias para me tornar mais leve. Deixando para trás pessoas, coisas, mágoas, tristezas. Como no filme "Viagem para Darjeeling", só estamos mesmo prontos para seguir quando somos capazes de deixar para trás as coisas que não importam mais.
Merci, Saturne.
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