Blog do Doutor Fofinho

"Tudo começou há algum tempo atrás na Ilha do Sol..." Há muitos anos eu montei esse blog, dando o nome "Le Cul du Tabou", inspirado por uma amiga, para falar sobre o tabu das coisas. Ganhei muitos seguidores, mas desde 2018 não escrevi mais nele. Estou retomando, agora com novo nome, o "Blog do Doutor Fofinho", muito mais a minha cara, minha identidade. Sejam bem vindos.

Saturday, July 24, 2010

ME GULLIVER! (Ou: o que fazer com baixinhos pentelhos?)


Quando era pequeno assistia as histórias de Gulliver. Lembro quando ele passava por apuros em Lilliput, uma terra imaginária de pequeninos seres de quinze centímetros vestidos em roupas medievais. Ele, sempre charmoso, galanteador e perspicaz, lidava com aqueles pequenos habitantes de forma sábia, paciente e, às vezes, violentamente, quando se cansava da teimosia deles.

Um falecido tio meu dizia que “os baixinhos são sempre muitos chatos e só servem para peidar em festas”. Não sei dizer se ele tinha tanta razão assim, mas talvez Gulliver compartilhasse dessa opinião em alguns momentos.

E, como Freud, Gulliver fez história e Lilliput deu origem a um adjetivo até hoje utilizado, o termo lilliputiano, que diz respeito a algo muito pequeno. Nunca tinha ouvido falar nisso, até um dia em que, num semnário da residência médica, sobre delírios e alucinações, escutei o termo “alucinações lilliputianas”, caracterizadas por visões de pequenos seres, humanos ou animais, em homenagem às histórias de Gulliver e, pasmem, geralmente produzidas por intoxicações por drogas alucinógenas.

Isso não foi só um aprendizado teórico, mas o “insight” de uma vivência passada e a constatação de suas causas, fatos esses que havia escondido de mim mesmo e dos outros, por medo da loucura, do ridículo e da incredulidade. Fato é que um dia, nos idos tempos de 1992, fiz minhas vezes de Gulliver…

Era outubro de 1992, estava no primeiro ano da faculdade. Fantasiado de chinês, fui à tal Festa do Equador, tradicional festa à fantasia organizada por alunos da faculdade. Lembro como se fosse hoje que não havia bebido muito. Dava pra contar nos dedos da mão as coisas que bebi: um Alexander na entrada, uma caipirinha de vodka após e dois ou três goles de cerveja de uma amiga na pista de dança. E nada mais. Após brincar de coqueteleira, dançando na pista, senti minha cabeça rodar. Rodava tanto, mais tanto, que nem deu tempo de chegar ao banheiro: vomitei embaixo da mesa mesmo. Senti-me um pouco melhor, mas ainda me sentia estranho, zonzo, enjoado… Fui para casa, deitei na cama e a única coisa que me lembro antes de adormecer foi de ter colocado o relógio para despertar para ir à faculdade.

Acordei zonzo, estragado mesmo. Olhei para o teto, que rodava um pouco e as frestas da janela traziam os incômodos raios de sol, que me invadiam como lasers… Baixei a cabeça e, ao meu redor, diversos homenzinhos e mulherzinhas de quinze centímetros, trajando roupas medievais punham-se ao meu redor, em cima do edredon, do meu travesseiro, apoiados em meus braços e pernas… Não, eu não estava sonhando. Nem estava delirando com cogumelos, como Fred Mercury (“We are the champignons”). Definitivamente eu estava em Lilliput, ou ela toda tinha vindo até mim.

- Quem são vocês? – perguntei

E eles todos respondiam, em uníssono, com vozes ardidas e enfáticas:

- Nós estamos aqui para te ajudar! Nós vamos cuidar de você!

Sentindo-me acuado e em perigo, ergui-me na cama, derrubando alguns deles…

- Não.. eu preciso sair, tenho que ir para a facul….
- Nããããããoooooooooooo!!!! Você não vaaaaaaaaaaaiiii-
- Responderam em côro, atirando meu corpo contra a cama novamente – Nós vamos cuidar de você! Você precisa descansar!!!!!
- Está bem, está bem… eu desisto..eu fico!
- Oba!!!!! Conseguimos!!!!!

E não lembro de mais nada. Após essa tal discussão com esses seres adormeci profundamente e ali fiquei por mais algumas horas. Acordei atrasado, fui para a faculdade me arrastando, como se tivesse na pior ressaca da minha vida… E enfim, só fui me dar conta do que havia acontecido comigo naquele outubro de 1992 cerca de oito anos após…

Resta a dúvida: quem me drogou? E com o quê? E como? Estaria naquela maldita cerveja ou nos drinques anteriores? Tenho certeza até hoje de que não foi um sonho. Eles eram vívidos, mas com cores de desenho animado. Não posso dizer que foi desagradável, mas sem dúvida, misterioso, intrigante. Eles nunca mais voltaram, nem eu jamais visitei Lilliput de novo.

Uma coisa eu aprendi. Minha mãe tinha razão: não aceite nada de estranhos.

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