O PRIMEIRO COMANDO DE MADONNA
Eu sempre gostei de Madonna. Suas músicas, seus clássicos, seus clips, suas performances. Assisti Blond Ambition no Estádio do Morumbi em São Paulo. Naquela época eu não sabia muito o que ela representava, mas como todo ídolo, ícone, superstar, ela é sempre aquela avalanche de novidades e tem reafirmado, ao longo dos anos, seu posto de rainha no showbiz.
Tive a oportunidade de ver a turnê "Confessions" em Miami e fiquei extremamente impressionado com a qualidade impecável do show. Sem falar que ela, que sempre gostou de chocar, usou seu poder de influência para, além de chocar, deixar uma mensagem: provocou a Igreja Católica, criticou a violência contra a mulher, contra os jovens e mandou uma mensagem de paz para árabes e judeus. Foi realmente uma experiência extática.
O álbum seguinte, "Candy shop", já não veio com a mesma força. Ouvi aquelas musiquinhas, mal me interessei pelo álbum. Cheguei a ir ao show em Paris, por ocasião de uma ida a um congresso, mas fui tomado, abduzido, sequestrado por ela ao assistir o show no Morumbi. Conhecendo um pouco mais as músicas, envolvido pela energia calorosa da platéia brasileira, mesmo não conseguindo superar a turnê anterior para mim, a loira me presenteou com uma deliciosa experiência.
Já não posso dizer o mesmo de MDNA Tour. Seu primeiro hit, vestidinha de cheerleader, cantando com voz de garotinha mimada, não me impressionou. De certo modo, ela conseguiu me cativar com a excelente apresentação no Super Bowl, mas não foi o suficiente para me movimentar a ir a um show. Recebi vários convites de amigos, recusei a todos. Tive intuitivamente dó de pagar por um ingresso e ficava repetindo: "só vou ao show se ganhar". E a profecia se cumpriu: ontem, no final da tarde, ganhei dois ingressos de uma amiga. Eu juro que cheguei a titubear se iria mesmo, mas fui atràs da máxima brasileira "de graça, até injeção na testa" e me arrependi.
É lógico, o material tecnológico impressionou. A abertura espetacular, com direito a igreja gótica e turíbulo foram impressionantes. Lá pelas tantas ela pega uma metralhadora, depois um revolver, começa cantar "Gang Bang" , dando tiros violentos em pseudo-bandidos-amantes. Imagens de sangue na tela. Para mim, o show acabou aí. Acho que ela esperava que a platéia vibrasse e gritasse a cada "baixa", mas o povo ficou mudo. E ela não desistiu. Cantou "Sorry" amarrada e arrastada por terroristas. Achei um despreparo ético. Nesses tempos em que o mundo vive tanta violência; nesse tempo muito recente em que a nossa cidade vive assolada pela violência, guerra de crime organizado, tráfico, Madonna escolheu chocar da pior maneira. Para mim, o seu mau gosto se equiparou a intratáveis como Rafinha Bastos.

Madonna: acho que essa porra vicia mesmo. Não deve ser à toa que o emblema que dá nome à turnê - MDNA - lembra muito o nome de uma droga que tem "alucinado" o mundo: o MDMA. Madonna vicia. Mas nesse estágio do vício, como falam meus pacientes dependentes de crack, quase não existe mais prazer. É só a imperiosa necessidade de consumir para não sofrer de abstinência. Ontem, para mim, uma droga que vicia e faz mal.
E, como toda droga, ela está em sua fase de decadência. Ela não está mais sarada; deve ter inclusive modificado o seu modelito daturnê para esconder o recente acentuar de suas curvas. Está bochechuda. Lembrei-me das barbies musculosas que começam a engordar a partir dos eternos 39, mas continuam tomando seus anabolizantes ostentando "tetas saradas" como a vaca profana da Gal Costa e um abdomen que não tem nada de tanquinho, parecendo mais uma bacia de ágata de cabeça para baixo.
Por um momento tive vontade de ir embora, no meio do show. Não fiz por respeito. Não a ela, mas à amiga que me convidou. Madonna conseguiu abrandar a minha decepção ao enveredar pelos clássicos, como Express yourself, Vogue e Like a prayer. Talvez ela tenha programado isso, cuspindo violência em nossas caras e depois adoçando o cuspe com hits de todos os tempos. Uma dissociação "live". Mas nunca em minha vida olhei tantas vezes no relógio num show, contando o tempo, esperando ansioso o seu término. Queria fugir de ver a decadência de Madonna.
E entre um playback e outro, ela se aventurou a cantar. Deus! Quem pode avisá-la que ela não é Nina Simone, nem Piaf, nem Ella, nem Janis. Divas que, mesmo no auge de seus descontroles, ainda eram capazes de cantar afinado. Não bastasse a voz de taquara raxada, ela ousa estrangular uma guitarra como se estivesse arrasando.
Mas não parou por aí. Após uma elegante performance de Vogue, revisitando o clássico modelito de Blond Ambition, ela resolve fazer strip-tease. Estava indo bem, até que resolve mostrar a bunda caída equilibrada no suporte de uma meia arrastão. Nas costas, "safadinha" escrito. Tudo o que precisava para fechar a noite era ter visto a bunda caída de Madonna. Fiquei lembrando da Derci Gonçalves, com a sua inadequação habitual acentuada pela velhice, mostrando suas pernas plastificadas e falando do seu mausoléu em construção. O filho da minha amiga, que também estava no show, não poupou a língua: "Mãe, a sua bunda caída tá melhor do que a dela."
Acho que essa turnê daria um bom filme. Trash-decadente e desrespeitoso. Achei um saco quando a Madonna estava metida a British lady, mas pelo menos estava com mais compostura. Não vou dizer que nunca mais irei a um show dela. Mas ficarei menos alheio às notícias da turnê da próxima vez. Acho triste a decadência e desejo profundamente que ela se recolha por uns bons anos, cabalista, budista, meditativa, pra recuperar um pouco a dignidade. Envelhecer pode ser doloroso, principalmente para pessoas como ela. Mas envelhecer sem crítica é muito doloroso para quem vê.
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