ADEUS, PAPA BENTO, ADEUS, A SUA CORJA LHE CHAMA...


Na sexta-feira, dia 25 de janeiro, fui à
Catedral da Sé em São Paulo assistir à cantata “Diário de Anne Frank”. Vou
dizer que fiquei surpreso. Num demoradíssimo ato ecumênico (zzzzzzzzzz.....),
católicos, judeus e árabes subiram juntos no altar para falar sobre a
necessidade de respeitarmos e propagarmos a liberdade religiosa. Fiquei triste
de não ver as outras religiões no altar; seria demais para eles. Fizeram
questão de afirmar uma certa supremacia das religiões “abrâmicas”; mas eles
estavam lá. Duas mães-de-santo, um monge budista, um engravatado que poderia
ser um evangélico. Durante o ato, foram lidos trechos de antigos concílios que
versavam sobre a necessidade de se respeitar as outras religiões, posto que
eram todas irmãs e cultuadoras de um Deus comum.
Eu gostaria muito de crer num mundo melhor.
Num mundo onde fossem aceitas e respeitadas todas as religiões e não-religiões,
todos os credos e não-credos. Eu não sou ateu; já fiquei ateu uns anos por
decepções e questionamentos, mas minha alma é fundamentalmente religiosa,
mística. Eu sinto necessidade de entrar em contato com o “sagrado”, como diria
um certo antropólogo. Mas não desprezo nem desconsidero os ateus. Acho que um
ateu honesto, digno, portador de princípios, respeitador do ser humano, vale
dez mil “crentes” ou deístas. Se ele vai para o céu ou não, problema dele. Mas
acredito que um ateu que pratica boas obras deve ir parar em lugares muito mais
avançados do que um crente maldizente.
Todos os dias, jovens homossexuais se
suicidam ou se envolvem com drogas porque não são aceitos pela sociedade, pela
família, pela sua igreja e, por contiguidade de tal ignorância, são levados a
acreditar que não são aceitos por Deus. E mais: nesse temeroso levante da
hipocrisia das indústrias-igreja, que arregimentam exércitos de fiéis preconceituosos,
ignorantes e intolerantes, temo pelas vidas de inúmeros jovens que são levados
a acreditar que são doentes ou pecadores por desejos que não escolheram e que
poderiam ser vividos de uma forma plena, saudável e feliz se bem aceitos.
Eu nasci todo errado. Errado para aqueles
pais que me colocaram no mundo. Errado para aquela igreja que frequentei
durante a infância, igreja que casou meus pais, que “abençoou” aquela união tão errada, tão
desarmônica. Errado naquele bairro – como quase todos os bairros de todas as
cidades, que edificam e “concretam” o preconceito e a intolerância. Errado
naquela escola nazista de professores que concediam ou não a dádiva de deixar
um aluno ir ao banheiro, de acordo com seus humores. Errado no meio de uma
família, como tantas outras famílias, que fazem chacota ao perceberem que têm
um elemento homossexual em seu seio. Cresci me acreditando errado. Foram
necessários anos de psicoterapia para curar tantas feridas, feridas essas que
me fariam um ser frágil, inseguro, negador de mim mesmo.
Sobraram cicatrizes. Várias. E faço questão
de mostrá-las, contando e recontando os passos da minha história, para que
tantos outros jovens possam ter a oportunidade de conhecer a verdade. Não a
verdade dos padres, dos papas, das igrejas, dos pastores, dos hipócritas; mas a
verdade da própria alma, a verdade da singular existência.
É por isso que estou emocionado ao saber
que um representante dessa massa podre da sociedade se despede de um cargo de
extrema projeção e capaz de influenciar lares, famílias, culturas. Numa
segunda-feira de carnaval, uma festa pagã, profana, popular, nas melhores
acepções dos termos, Bento se despede. Nem quero pensar no que virá, o que será.
Quero apenas sonhar que a Igreja Católica fecha suas portas, constrita,
reservada, pensativa, durante a quaresma, a percorrer um calvário de morte e
renascimento.
3 Comments:
Muito Bom,meu amigo!
bjs
Ótimo texto! :)
Obrigado! ;-)
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